Heresias, tão antigas e tão novas: o gnosticismo



NO INÍCIO DA IGREJA, especificamente nos séculos II e III, encontramos um fenômeno que irá mexer muito com o pensamento critão: a gnose. O que seria, afinal, a gnose? O que foi o gnosticismo, quais suas características e origem?

Geralmente, os especialistas distinguem gnose de gnosticismo. A gnose, – o significado da palavra, que vem do grego, é conhecimento, – indica um fenômeno mais amplo e presente no ser humano, de buscar o sentido da vida no conhecimento. Enquanto o gnosticismo seria a manifestação histórica da gnose nos séculos II e III. É algo concomitante ao surgimento da Tradição cristã.

A origem deste movimento ainda é bastante discutida, e também ignorada. Alguns pesquisadores admitem a existência de uma pré-gnose grega e de alguma pré-gnose judaica. O que sabemos sobre o gnosticismo provém de fontes cristãs antigas e de fontes originais recuperadas no século XX por pesquisadores.

O chamado gnosticismo cristão é fruto de todo um processo de influência do pensamento judaico dividido, pois nem todos seguiam a doutrina oficial, sobre os cristãos e também de elementos da cultura grega.

Desde o início da Igreja já encontramos o conflito com cristãos enamorados pela doutrina gnóstica. A tradição joanina, por exemplo, discute com os nicolaítas (Ap 2,6).

Geralmente, neste debate, os três nomes mais citados representando o gnosticismo são: Marcião, Basílides e Valentim. Apesar das diferenças no modo de pensar dos chamados "gnósticos cristãos", encontramos algumas características comuns, como:

• O uso de representações mitológicas;

• A interpretação extremamente imaginativa da Bíblia e da simbologia dos números;

• A preferência pelo gênero apocalíptico;

• Uma postura esotérica, pois o gnóstico acredita ser beneficiado pela revelação de um segredo transmitido apenas aos iniciados;

• Uma atitude anticósmica, antimaterial e anti-histórica, ou seja, o mundo visível é mau em si mesmo e tudo o que é corpóreo e temporal é ruim e não pode ser salvo.

Enfim, um modo de pensar dualista caracteriza o gnosticismo, em termos de luz e trevas, bem e mal, indicando que o mundo é resultado de duas realidades antagônicas que não podem se conciliar.

Por fim, para o gnosticismo, a salvação não vem pela Graça divina, mas por intermédio de um conhecimento perfeito que permitiria ao gnóstico se libertar deste mundo inferior e retornar à sua verdadeira origem e realidade espiritual.

Este modo de pensar foi profundamente questionado e denunciado por Santo Ireneu de Lyon (ou Irineu de Lião, na versão aportuguesada) em sua obra magna Adversus Haereses. Ireneu mostra como a doutrina dos gnósticos é absolutamente incompatível com a fé cristã genuína, pois nega, entre outros fundamentos, toda a doutrina da Criação, da Encarnação do Verbo de Deus e da sua Obra de Redenção. Somos salvos por tudo o que Cristo realizou e não devido ás nossas próprias capacidades, por meio de um conhecimento privilegiado, reservado a um grupo de "escolhidos" privilegiado e especial.

Infelizmente, em nossos dias, alguns cristãos ainda acham que tudo oe que é corpóreo, material e temporal é mau, esquecendo-se de que tudo o que existe foi criado por Deus e, portanto, é um bem. Jesus não teve um corpo meramente aparente, mas real, carnal, humano. O que não foi assumido não poderia ser salvo, como advertiu, para a posteridade, Santo Ireneu. O mau não está nas criaturas, como creem os gnósticos, mas na maneira como nos relacionamos com elas. 



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Esta é a terceira parte de uma série de postagens relacionadas entre si, adaptadas do conteúdo do recém-lançado (e precioso) opúsculo do Prof. Dr. Joel Gracioso, “Heresias: tão antigas e tão novas” (Kenosis/DDM, 2015), que divulgamos, pedindo a Nosso Senhor que renove, nos corações dos homens, o amor sincero pela Verdade eterna.

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Fonte:
GRACIOSO, Joel, Heresias: tão antigas e tão novas. São Paulo: Kenosis; DDM, 2015, pp. 15-17.
* O texto deste artigo contém excertos de Henrique Sebastião, autor/editor de 'O Fiel Católico'

3 comentários:

  1. Já li que os cátaros (albigenses) eram agnósticos,é verda
    de?

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    1. A questão é complexa, anônimo, e eu não sou especialista no assunto. Há controvérsia quanto a classificar os cátaros como gnósticos, em especial no que se refere às conexões históricas. De fato, são frequentemente agrupados sob o nome de "gnósticos" grupos diversos, mas as semelhanças doutrinárias são inegáveis. Pode-se dizer que suas crenças são no mínimo paralelas, também com as dos paulicianos e dos bogomilos, entre outros.

      A Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo

      Apostolado Fiel Católico

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  2. interessante... quero entender melhor isso!

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