“Pai, perdoai-os; eles não sabem o que fazem!” (Lucas 23,34)
COMO DIZ G. K. Chesterton: “Por natureza, a evidência do Éden é algo que não pode ser encontrado. Por natureza, a evidência do pecado é algo impossível de não encontrar”¹. É possível encontrar o mal e o pecado no simples ato de ler um jornal ou então, no não tão simples ato de olhar para si mesmo e reconhecer as próprias misérias. Devido ao Pecado Original e à Queda de Adão e Eva, toda a humanidade ficou manchada e desfigurada, literalmente longe de seu propósito e fim último de sua existência: Deus.
Então, é conhecido e perceptível que há um abismo imenso entre a perfeição de Deus e o homem, e por culpa do próprio homem. Era necessário que esse abismo, – que essa culpa, – fosse vencido. Porém, o homem por si mesmo não é capaz de vencê-lo. A ofensa que foi feita a Deus só podia ser perdoada pelo próprio Deus, sendo assim, eis que o SENHOR, em Sua bondade e amor, vem ao nosso encontro.
O budismo e diversas religiões hinduístas têm a crença de que a religiosidade é toda baseada na ação do homem ativo que encontra deus, e esse deus encontrado é um deus passivo, que nada faz. O cristianismo ensina justamente o contrário: não somos nós que buscamos Deus em primeiro lugar, mas é Deus mesmo Quem Se revela ao homem buscando restabelecer a união com a criatura decaída.
Para refletirmos melhor nesse santo Mistério, é necessário mergulhar na Doutrina puríssima que a Santa Igreja nos deixa como herança, vasculhemos então o Catecismo da Igreja Católica, no caso, alguns trechos que seguem:
“(...)A fé é a resposta do homem a Deus, que a ele Se revela e Se oferece, resposta que, ao mesmo tempo, traz uma luz superabundante ao homem que busca o sentido último da sua vida.”
(CIC §26)
“O desejo de Deus é um sentimento inscrito no coração do homem, porque o homem foi criado por Deus e para Deus. Deus não cessa de atrair o homem para Si e só em Deus é que o homem encontra a verdade e a felicidade que procura sem descanso (...)”
(CIC §27)
“«Exulte o coração dos que procuram o Senhor» (Sl 105, 3). Se o homem pode esquecer ou rejeitar Deus, Deus é que nunca deixa de chamar todo o homem a que O procure, para que encontre a vida e a felicidade. Mas esta busca exige do homem todo o esforço da sua inteligência, a rectidão da sua vontade, «um coração recto», e também o testemunho de outros que o ensinam a procurar Deus. És grande, Senhor, e altamente louvável; grande é o teu poder e a tua sabedoria é sem medida. E o homem, pequena parcela da tua criação, pretende louvar-Te – precisamente ele que, revestido da sua condição mortal, traz em si o testemunho do seu pecado, o testemunho de que Tu resistes aos soberbos. Apesar de tudo, o homem, pequena parcela da tua criação, quer louvar-Te. Tu próprio a isso o incitas, fazendo com que ele encontre as suas delícias no teu louvor, porque nos fizeste para Ti e o nosso coração não descansa enquanto não repousar em Ti.”
(CIC §30)
Vejamos que não é o homem que primeiro ama Deus, muito pelo contrário, o Pecado Original é justamente a prova de que o homem nega a Deus, que o homem muitas vezes nega o Amor. Deus nos ama em primeiro lugar. Ele nos quer; Ele Se revela para nós; Ele veio ao nosso encontro para que não fiquemos perdidos ao buscá-Lo, mas antes, encontremos a Ele que nos ama sempre.
Temos exemplos claros de que Deus nos ama em primeiro lugar lendo o Livro de Jeremias: “Antes que no seio fosses formado, eu já te conhecia; antes de teu nascimento, eu já te havia consagrado, e te havia designado profeta das nações” (1, 5) e também no livro do profeta Isaías: “Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, Eu (Deus) não te esqueceria nunca. Eis que estás gravada na palma de minhas mãos, tenho sempre sob os olhos tuas muralhas” (49,15-16).
O amor do homem para com Deus é sempre uma resposta a este primeiro belíssimo e zeloso Amor que Deus tem para conosco. – Na liturgia latina, mais precisamente no rito extraordinário da Santa Missa, também conhecido como a Santa Missa Tridentina, no momento do Cânon (Oblação do Sacrifício) há um curto diálogo entre o celebrante e a assembleia para que seja despertado nas almas o verdadeiro sentimento de ação de graças. No último trecho desse diálogo, proclama o celebrante: “Gratias agamus Domino Deo nostro / Demos graças ao Senhor, nosso Deus”, e então a assembleia responde: “Dignum et justum est! / É digno e justo”². É uma proclamação de que Deus merece ser amado por nós, Ele merece uma resposta do homem pelo fato de ser Deus e, sendo Deus, Bom e Inefável, – em resumo, o próprio Amor, – merece ser amado por nós.
Mesmo que falhemos nessa missão de amar a Deus sobre todas as coisas, porém, o SENHOR nos aguarda sempre de braços abertos quando realmente nos arrependemos dos nossos pecados e pedimos perdão no Sacramento da Confissão. Isso fica bem esclarecido na parábola do Filho Pródigo no evangelho segundo São Lucas (15, 11-24). Deus é esse Rei cheio de amor, que entrega a Si mesmo para salvar-nos, nós que somos escravos e miseráveis!
Eis que São João nos ensina no capítulo 3 de seu Evangelho: “Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus não enviou o Filho ao mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja salvo por ele” (16-17).
Deus não deseja a nossa condenação, muito pelo contrário, como afirma São Paulo em sua primeira Carta à Timóteo: “.Isto é bom e agradável diante de Deus, nosso Salvador, o qual deseja que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (2,3-4). Quando as almas são condenadas ao inferno, são condenadas por culpa própria, porque usaram de forma incorreta sua vida terrena e sua liberdade e se mantiveram impenitentes até o último instante, e Deus que é justo dá a cada um conforme suas obras e escolhas. Todavia a justiça não anula a misericórdia, antes, ambas coexistem.
O SENHOR, sabendo de nossas fraquezas e de nossas debilidades, nos perdoa e nos presenteia com os meios pelos quais somos perdoados por Ele, especificamente falando dos Sacramentos da Igreja Católica. Os Sacramentos são meios seguros e eficazes de obter as graças de Deus e os benefícios que estes Dons geram em nossa alma, pelo toque da humanidade divina de Cristo que age na pessoa do sacerdote e cura as feridas mais horrendas que carregamos em nosso interior e ainda nos dá forças para podermos ser santos.
No sacramento da Confissão, quando o penitente está realmente arrependido de seus pecados, – compreendamos aqui que o arrependimento não é um simples "choramingo" momentâneo, mas antes o firme desejo de não cometer novamente o pecado, a total aversão e repulsa por aquilo que ofende a Deus, – Cristo lava essa alma com o Seu próprio Sangue glorioso, que com uma só gota pode salvar a humanidade inteira!
Não somente por sermos alvejados com o Sangue do cordeiro, mas também pela certeza da eficácia do Sacramento, alcançamos a paz da alma devido aos méritos de Cristo.
Sendo assim, faz-se necessário que realizemos um exame de consciência sincero e verdadeiro e nos perguntemos se realmente estamos amando a Deus. E não somente amar por palavras, mas por ações concretas.
Na oração do Pai-Nosso pedimos a Deus: “Perdoai-nos às nossas dividas assim como nós perdoamos aos nossos devedores”. Pois bem, se não tomarmos cuidado e vigiarmos nossas vidas, esse pedido se tornará uma auto-condenação, visto que ao não perdoarmos não seremos perdoados também. E uma das maiores fontes de perdão que emana do ser humano é justamente a própria miséria humana; pois, ao sabermos que somos amados por Deus e que Ele, em sua Majestade, nos perdoa os pecados, como podemos nós, miseráveis mendicantes, negar o perdão a um irmão arrependido? É a realidade divinamente ilustrada na parábola do servo impiedoso, no Evangelho segundo São Mateus (18,23-30).
Lembre-se das suas próprias misérias, ó cristão, e que o SENHOR, nosso Deus, o perdoa quando você se arrepende verdadeiramente; então, seja misericordioso como o Pai é misericordioso. Entenda, com clareza, que o perdão não é amnésia, e que as ofensas recebidas não serão apagadas da sua memória; antes, são como que sinalizadores sensoriais que lhe permitem lembrar das próprias misérias. Assim, ajudam a compreender as misérias d'Aquele que tem um coração contrito e que quer mudar, quer ser santo também.
Perdoar para ser perdoado, perdoar verdadeiramente para alcançar a Paz divina: eis o remédio que muitas almas amarguradas buscam incessantemente e não encontram! Muitos não perdoam, alimentam o ódio e a vingança e não percebem que, assim, eles mesmos se tornam escravos do que alimentam. Ao conhecermos a Verdade, que é Deus, seremos libertos verdadeiramente, e essa liberdade também consiste no perdão, porque Deus mesmo nos perdoou e continua perdoando.
Peçamos perdão pelos nossos pecados no Sacramento da Confissão, e vivamos como nos é ensinado no Livro de Tobias: “Não faças a ninguém o que não queres que te façam” (4,15), e sigamos retamente as ordens do Cristo: "Perdoar não sete vezes, mas setenta vezes sete (Mt 18, 21-22).
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Notas e ref. bibliográfica:
1. CHESTERTON, Gilbert Keith - Women in the Workplace — and at Home publicado no The Illustrated London News, 18th December, 1926. Disponível em: http://www.sociedadechestertonbrasil.org/artigos/page/37/
2. Missal quotidiano e vesperal por Dom Gaspar Lefebvre. Disponível em: http://www.montfort.org.br/old/index.php?secao=documentos&subsecao=decretos&artigo=ordinario_santa_missa&lang=bra
www.ofielcatolico.com.br
Parabéns ao O FIEL CATÓLICO. Cada vez mais sou feliz por ser católico, essa Igreja verdadeira de Jesus Cristo é Linda, é o máximo, Obrigado DEUS PAI, FILHO E ESPIRITO SANTO POR ESSA MAGNIFICA CRIAÇÃO DO TEU AMOR.Louvado seja Deus para sempre. AMÉM
ResponderExcluirLouvado seja nosso senhor Jesus Cristo!
ResponderExcluirParabéns por mais um brilhante texto.
Deus nos perdoa pela sua infinita misericórdia quando nos arrependemos VERDADEIRAMENTE dos nossos pecados. Então, por favor, me ajudem com uma dúvida angustiante: devemos perdoar aqueles irmãos que não demonstram estarem arrependidos por nos ofenderem? Ou que nem mesmo sintam o mínimo de arrependimento, demonstrando, muitas vezes, que nem ao menos percebem que cometeram grave ofensa?
Deus os abençoem e fortaleçam nessa importante missão de evangelizar!
Olá irmão brasilreal....estou passando por isso na minha própria pele e muito angustiado. Entrei aqui e encontrei sua pergunta e foi como um alento. Sempre fui perdoador, nunca me precipitei sem analisar ao fundo um determimada situação e em muitas dessas situações fui sumariamente aviltado, ridicularizado, ofendido, humilhado...por pessoas de minha maior consideração que sequer demonstram arrependimento por seus atos...quando questionados a respeito do que fizeram fingem que não foi nada, fazem pouco caso do sofrimento de um inocente e não hesitam em fazê-lo sofrer novamente. Portanto pergunto: nessas situações como que ficamos? Não temos o direito de lutar pelo que é justo e condenar as injustiças e, em casos graves, quem as dissemina? Muito confuso com essas questões e dilemas. Espero que ofielcatolico nos responda...
ResponderExcluirEm Cristo para todo o sempre!