Síndrome nas redes sociais: por que ninguém faz nada?


Por Igor Andrade – Frat. Laical São Próspero

COMEÇO A ESCREVER essas linhas por volta das 18h do dia 26 de julho de 2016. Hoje, ao acordar, a primeira notícia com que me deparo é o martírio do padre Jacques Hamel, ocorrido nesta manhã durante a celebração de uma Santa Missa na França. Como era de se esperar, o ocorrido não foi veiculado integralmente na grande mídia e não vi “defensores” dos Direitos Humanos lançarem uma campanha “Je suis Père Hamel”. Porém, me detive num fenômeno tão sentimentalista quanto.
Como é de se esperar as pessoas reagiram a um ataque terrorista. Como foi um ataque contra um grupo cristão, os cristãos – é evidente que não foram todos, sequer foi a maior parte – reagiram: tomaram em armas e foram combater a invasão horizontal dos bárbaros na Europa. Mentira, claro que não fizeram isso. Então eles teriam iniciado uma campanha mundial de oração pelos cristãos perseguidos? Também não. Talvez formaram um grupo de pregação e foram para onde a Igreja é perseguida evangelizar? Definitivamente não.

Numa enorme onda de indignação e zelo, uma parte dos católicos se juntou para, corajosamente... isso mesmo, trocar a foto do facebook, compartilhar o nome do sacerdote mártir e – pasmem – criticar as ações do Santo Padre – sim, aparentemente o Vigário de Cristo estar na Jornada Mundial da Juventude, e a própria Jornada são atitudes “anticatólicas”. Nas redes sociais se encerrou todo o ímpeto daqueles que dizem se importar com a perseguição sofrida pela Igreja e com a decadência da Europa.

Meu intuito aqui é mostrar, sobretudo, como o sentimentalismo tóxico impregnou as ações não só dos grupos católicos, mas também dos grupos políticos, e como isso desmobiliza as ações boas e facilita a invasão bárbara sofrida pelo Ocidente.

Numa conversa com grandes amigos, clara e justamente indignados com as atrocidades cometidas pelos maometanos, foi dito que indignação não adianta, “Ok, mas ser indiferente também não!”, respondeu um deles. De fato, ele está certo. A proposta de Cristo não é a indiferença – ou o pacifismo. Diante daqueles que entram em nossas igrejas, estupram nossas mulheres e destroem nossa cultura, dizer que o “Islã é religião de paz” e ignorar os fatos não só é contraproducente como também é apoiar o genocídio que ocorre debaixo de nossos narizes, ou simples ignorância.

Como eu sempre procuro deixar claro em minhas falas, senão num extremo nem no outro, onde está a virtude? Qual posição tomar? Creio que a atitude de um cristão autêntico deve ser a mesma postura de Cristo (parecida com a de Sócrates no conteúdo, mas um pouco diferente quanto ao fim) e dos mártires: devemos ser corajosos.

Ora, que é, pois, a coragem que devemos pôr em prática? O cardeal Robert Sarah, no livro Deus ou Nada, diz que não há necessidade de coragem para falar contra a Igreja, mas sim para aderir à Fé. A Fé “adulta” é aquela dos cristãos que morrem todos os dias na África, na Ásia e agora na Europa. É a fé de todos os mártires que seguiram a Cristo.



Diante de Pilatos, Cristo não “bateu de frente” com ele, não disse que o governador romano não tinha poder para prendê-lo, mas, ao contrário, confirmou o poder romano sobre sua vida terrena. “O meu Reino não é deste mundo”, disse Nosso Senhor, “não terias poder algum sobre mim, se de cima não te fora dado”. Eis a Coragem da Verdade! Eis a coragem que não foge frente a injustiça mas permanece firme e convicto frente ao poder do mundo, das armas!

Na obra “O Diálogo das Carmelitas”, Georges Bernanos descreve uma conversa entre o sacerdote do convento e a Irmã Branca da Agonia de Cristo[1]: “Eles te chamam de fora da lei”, diz a jovem freira ao sacerdote que responde, “o que a lei garante? Os nossos bens e nossa vida. Ora, aos bens nós já renunciamos e nossa vida está nas mãos de Deus. Eles não podem fazer mais nada”. Eis a coragem cristã.

Em meu último texto, contei a história do bem-aventurado Jose Luis Sanchez, mártir cristero. A postura daquele garoto diante dos algozes é uma clara manifestação da virtude da Fortaleza. Não a virtude humana, mas a virtude do Espírito Santo. “Entre seus atos de coragem, disse: ‘Por que me oferecem liberdade? Sou seu inimigo! Fuzilem-me! Viva Cristo Rei!’”(Leia).

Que quero dizer com esses exemplos? Devemos ficar inertes vendo nossos irmãos morrem? Não, jamais! Devemos TRABALHAR contra os inimigos de Cristo, por Deus, pela Igreja! Mas porque não o fazemos? Porque o sentimentalismo nos intoxicou. Vivemos numa época de aparências, onde as pessoas querem mostrar seu sentimento. Mostrar e nada mais. Mas esta não é a postura de Cristo. Ele não ficou inerte, muito menos ficou se fazendo de vítima.

Um grande amigo fez uma observação interessante sobre a Via Crucis. No momento em que Cristo encontra com as mulheres que choram e Nosso Senhor lhes diz: “Filhas de Jerusalém, não choreis sobre mim, mas chorai sobre vós mesmas e sobre vossos filhos. [...]Porque, se eles fazem isto ao lenho verde, que acontecerá ao seco?” (Lc 23, 28.31). A tristeza das mulheres era falsa? Parece que não, mas sua demonstração era exagerada, elas não enfrentaram a situação como o Cristo, com coragem.



 O problema da era das redes sociais é justamente esse: as pessoas demonstram – geralmente para mostrarem uma falsa disposição interior – mas não direcionam suas forças ao que é efetivo.

No livro “Podres de Mimados”, Theodore Dalrymple dedica um capítulo inteiro à manifestação pública do sentimentalismo citando o caso da menina Madeleine. Filha de pais milionários ela desapareceu durante uma viagem da família. O que os pais fizeram além de chamar a atenção da mídia mundial? Isso mesmo, um website que vendia pulseiras com o nome da criança. Agora, como se encontra uma criança desaparecida comprando uma pulseira com seu nome? Isso mesmo, da mesma forma que se para os atentados contra os cristãos mudando a foto do facebook e demonstrando sua indignação.

Por isso o sentimentalismo nunca é efetivo e, na verdade, atrapalha. A pessoa publica sua indignação na timeline e só se recorda no ano seguinte porque essa é uma ferramenta do facebook. Como bem disse o Pe. Jose Eduardo – a quem peço desculpas por copiar descaradamente – “até nos chocamos num primeiro instante, mas logo depois nos tranquilizamos e voltamos comodamente à vidinha. Vejam como o humanismo nos desumanizou!”.



O que nos é efetivo aqui, na Terra de Santa Cruz? A perseguição que sofremos aqui ainda não é – e com a Graça de Deus, por intermédio da Santa Virgem Aparecida, nunca será – física, então devemos usar os meios de que dispomos para “alargar cá em baixo as fronteiras do Reino de Deus”[2]. Como? No trabalho ordinário, na oração, no jejum, na Santa Missa, sendo santos, vivendo cristãmente, sem exageros ideológicos, nunca desprezando um infiel – seja ele islâmico, protestante, etc. – mas trabalhando por sua conversão.

E o que fazer quando somos atacados? Se um muçulmano vier me atacar porque sou cristão? Defenda-se. Nunca esqueçamos que existe uma guerra justa. Reitero o dito acima: o cristianismo não é pacifista. Coragem e Prudência sempre! Nunca na intenção de se autoafirmar, mas tudo ad majorem Dei gloriam!

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[1] Tragicamente, não tenho o livro em mãos, então ponho aqui as palavras que me recordo.
[2] Regra da Milícia de Santa Maria.
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Padre é degolado por islâmicos dentro de igreja na França



UM SACERDOTE DE 84 ANOS de idade, chamado Jacques Hamel (foto), morreu mártir, degolado por islâmicos nesta terça-feira (26/7) na igreja de Saint-Etienne-du-Rouvray, noroeste da França. A ação, que foi reivindicada pelo grupo Estado Islâmico, acontece menos de duas semanas depois do atentado em Nice, que deixou 84 mortos e mais de 300 feridos.

Das cinco pessoas que estavam na igreja no momento do atentado, praticado por dois homens armados, três reféns foram libertados ilesos e um quarto em estado grave, entre a vida e a morte. Segundo Pierre Henry Brandet, porta-voz do ministério do Interior, a Brigada de Busca e Intervenção (BRI), especializada em sequestros, cercou o local e os dois criminosos terminaram mortos.

Os criminosos “disseram pertencer ao Daesh”, acrônimo em árabe do grupo Estado Islâmico (EI), informou o presidente francês, François Hollande. Segundo comunicado da agência Amaq, órgão de propaganda dos extremistas, o ataque foi executado por “dois de seus soldados” e “os autores do ataque responderam aos chamados para atacar os países da coalizão internacional” que luta contra o EI no Iraque e na Síria.

O papa Francisco expressou “dor e horror” por este “assassinato bárbaro”, indicou o Vaticano em um comunicado.

Vários ataques na Alemanha nos últimos dias também aumentaram os temores na Europa. Em sua propaganda e comunicados de reivindicação, o EI convoca a atacar os líderes “cruzados” ocidentais e o “Reino da Cruz”, uma expressão que faz referência ao continente europeu.

Cerca de 700 escolas e sinagogas judaicas e entre 1.000 e 2.500 mesquitas estão protegidas por militares, mas parece difícil aplicar estas mesmas medidas de segurança às 4.500 igrejas católicas do país.

Tende misericórdia, Senhor, da Europa e do mundo inteiro!

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Ref.:
IstoÉ Mundo, disp. em:
http://istoe.com.br/padre-e-degolado-em-tomada-de-refens-em-igreja-na-franca/
Acesso 26/7/016

O que respondi no Facebook: Tradição, tradicionalismo e a arrogância da juventude

REPRODUZO ABAIXO a postagem que me foi enviada no Facebook, do seminarista carioca Matheus Muniz, que me parece um jovem cheio de fé e esperança e um futuro digno pastor da Igreja de Cristo. Respondi a esta postagem com um comentário que vem sendo replicado por diversas pessoas em suas próprias páginas, o que me chamou a atenção: talvez algo daquilo que ponderei possa ter algum valor intrínseco para o povo católico em geral. O problema citado pelo seminarista de fato existe e é palpitante, então resolvi publicar o comentário, seguido de minha resposta, por aqui. Segue abaixo; rogamos a Deus que seja útil.


Sabe qual é o problema? O problema é que esse jovem que se converte, nos nossos tempos, não é como o jovem de antigamente, e o digo por dois motivos: primeiro, porque ele é mais bem informado e está melhor preparado do que os nossos pais e avós estavam, na época deles; as disposições com que se aproximam da Igreja são bastante diferentes. Segundo, porque o projeto de Igreja que se apresenta para ele, hoje, também não é mais o mesmo que se apresentava aos nossos pais e avós.

O jovem de hoje, via de regra, se converte mais pela razão do que pela emoção. Ele se apaixonou e se converteu àquela Igreja heroica, dos santos e dos mártires; Igreja que preserva os dogmas; Igreja que está sempre disposta a dar a vida em sacrifício pela defesa da Verdade (que é Cristo); Igreja que tem valores inegociáveis; Igreja que celebra na Santa Missa a Renovação incruenta do Sacrifício do Calvário; Igreja que mantém a mesma fé apostólica por dois milênios; Igreja que é, enfim, a continuidade histórica de Nosso Senhor Jesus Cristo no mundo...

Aí ele faz o quê? Procura o padre da paróquia mais próxima para se confessar e receber os demais Sacramentos. Chegando lá, logo de cara, o padre já lhe diz que vários daqueles pecados que ele está confessando já não são mais pecados, que isso é coisa do passado, que agora a Igreja está se "modernizando"... E ele pensa: mas a Igreja por acaso mudou a doutrina? Deus pode mudar? Mas esse jovem bem informado sabe que aqueles são pecados que precisam ser confessados, sim; para ele, essa recepção é algo inesperado, muito estranho e também muito frustrante... Uma grande decepção.

Então ele vai à Missa e vê um bando de gente dançando, pulando e sambando, e o padre a dizer que a Missa é festa, que é "o encontro dos irmãos em torno da mesa da partilha" e todo um discurso socialista que ele abomina, porque sabe que é falso e anticristão (e que já foi por diversas vezes condenado pela Igreja, mas por alguma estranha razão continua na boca dos sacerdotes que deveriam combatê-lo). Também ouve muitos padres dizendo que "a religião não importa, o importante é o amor" ou "acreditar em alguma coisa" ou "ter Deus no coração"...

E esse jovem recém-convertido vai ficando cada vez mais perplexo, porque sabe que nada daquilo corresponde à verdadeira doutrina da Igreja. Quando, empolgado, ele procura alguma pastoral para integrar, pois como leigo quer participar ativamente no Corpo de Cristo, percebe uma série de intriguinhas, guerra de vaidades, fofoca de gente materialista e sem fé... Tudo menos a coerência com o Evangelho e o amor fraterno que ele esperava encontrar, e é mais do que nítido que esse estado de coisas é o resultado da má formação, da catequese deficiente, da falta de zelo dos pastores. E é assim que uma sucessão de tragédias vai fazendo com que esse jovem – que é inteligente, que estuda e tem uma fé ardente – perceba que há uma absurda e imensa distância entre a Igreja dos santos e dos mártires, a Igreja da música sacra, das catedrais, das artes e dos grandes teólogos, à qual ele realmente se converteu, e aquela caricatura de Igreja que ele encontra ali na paróquia da esquina, do pároco comunista militante e dos fiéis desinteressados.

E assim a perplexidade se torna indignação; ele se revolta e –, por amor a Deus –, quer protestar, quer combater as heresias entranhadas no seio do Corpo de Cristo que ele tanto ama e deseja.

Não, esses jovens não são "carrascos". Sim, existem os radicais, aos quais falta caridade e humildade para enxergar que Nosso Senhor está ali, mesmo naquela paróquia tão cheia de problemas, e que é preciso paciência e amor fraterno para mudar as coisas, mais do que arrogância e duras criticas. Sim, mas também há uma geração (graças a Deus!) de jovens que não se conformam de ver que a "fumaça de Satanás" não só penetrou, mas infestou a Igreja de Cristo, contaminou o ar, sufoca aqueles que querem ser santos. Com toda a justiça, esses jovens se sentem indignados, e eu digo que me identifico totalmente com eles!

Estes não se dobram e nem se dobrarão a ninguém, nem a padres nem a bispos traidores, nem às conferências vendidas às ideologias esquerdistas. São jovens cheios de ira santa diante dos vendilhões do Templo! Estes, sim, merecem o apoio de todo verdadeiro fiel católico. A estes, eu digo: Contem com o meu respeito e as minhas orações; já não sou tão jovem, mas eu já fui e continuo sendo um de vocês!

Henrique Sebastião, leigo devoto de
São Próspero de Aquitânia que, mesmo leigo,
ensinava doutrina aos bispos do seu tempo
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Jose Luis Sanchez del Rio – vida e exemplo de santidade


Por Igor Andrade – Assoc. São Próspero e Movimento Somar para Vencer

É DE MEU COSTUME escrever sobre temas geralmente voltados à filosofia, à política e à crítica. Contudo, este é o primeiro artigo de uma série, provavelmente nada longa, sobre um santo que me fala muito ao coração: o Mártir Jose Sanchez del Río, que será canonizado, com a Graça do Bom Deus, em outubro do ano 2016 de Nosso Senhor Jesus Cristo. Primeiramente vou falar um pouco de sua vida e seu martírio, depois, tratarei de alguns pontos de sua vida que creio serem absolutamente importantes para a cristandade atual.

O presente artigo trata da vida deste que é um dos Amigos que tenho no Céu. Não tratarei de nossa amizade em particular –, embora me seja muito prazeroso –, mas sim de como este menino de “quinze anos incompletos” chegou ao Céu em odor de santidade como “um servo bom e fiel”. Por isso, há aqui muitas datas e nomes-chave que nos situarão em sua época e nos ajudarão a entender como Jose Sanchez passou pela “Porta estreita”.

Jose Luis Sanchez del Rio é um Mártir de Cristo Rei que, junto com seus companheiros, deu sua vida generosamente por Cristo, por sua Igreja e por sua pátria; que suportou as dificuldades de sua época, não se omitindo mas lutando em um ambiente de ódio à fé e de perseguição sangrenta. Junto com os seus, o beato “Joselito” é um dos belos tesouros que o México e a América Latina deram à Igreja e ao mundo, já que ofereceu um exemplo de heroísmo e de amor, como os primeiros mártires das perseguições romanas.



Os Mártires Cristeros formam um grupo dos melhores filhos que o México deu à Igreja

Jose Sanchez del Rio nasceu em 28 de março de 1913, na cidade se Sahuayo, Michoacán, em pleno caos da Revolução Mexicana iniciada em 1910 e que derrubou o presidente Porfírio Diaz – que estava há trinta anos no poder.

Como é sabido, o espírito revolucionário é em si mesmo anticristão, por isso, com o triunfo da revolução, triunfaram também a miséria e o anticlericalismo exacerbado e as lutas pelo poder. Esse é o contexto no qual se desenrolou a infância de nosso santo mártir.

Apesar da instabilidade política e social da nação, é necessário destacar que as famílias mexicanas mantinham sua Fé católica, e as associações seculares cresciam em toda a nação, junto com as atividades de apostolado. Nas regiões verdadeiramente cristãs, as pessoas tinham o forte hábito da récita do santo Rosário, o que –, junto com o catecismo e os livros de piedade –, formava na Fé aquela geração.

Jose Luis teve a graça de viver em uma família com profundas raízes cristãs, e não é de duvidar que este foi o lugar onde se construiu o templo do futuro soldado de Cristo. Seus pais – Macário Sanchez e Maria del Rio – o educaram cristãmente, junto com seus irmãos.

Em 1917, entra em vigor uma nova constituição para o México, redigida por um grupo minoritário – isso mesmo, por uma minoria – que pretendia excluir o sentido geral da nação (qualquer semelhança com o que grupos minoritários ditos 'libertários' tentam implantar no Brasil, não à força as armas, mas interferindo em toda a nossa produção cultural, será mera coincidência). Junto com a nova Carta Magna, veio uma intolerância extrema à Igreja Católica no México. Nos anos seguintes, a perseguição se fortaleceria com atos esporádicos de repressão, ainda que nada “oficial”, por assim dizer.

Por conta da instabilidade política, a família Sanchez del Rio se mudou de Sahuayo para Guadalajara, onde Jose Luis deu continuidade aos seus estudos e recebeu a Primeira Comunhão. Se destacou pela devoção mariana, indiscutível prenda de salvação, e pertenceu às vanguardas da Associação Católica da Juventude Mexicana, grupo apostólico importante na resistência contra as perseguições do governo.


Distintivo da Associação Católica da Juventude Mexicana

Em 1926, o presidente Plutarco Elias Calles, conhecido maçon e –, por conseguinte, anticatólico –, principiou a aplicar leis perseguidoras à Igreja, legislando a favor de ideias anticlericais, dando início às mais fortes perseguições aos cristãos de todo o México. A Igreja, ante a impossibilidade de exercer o seu Ministério, fecha templos com a aprovação de Sua Santidade o papa Pio XI. Em pouco tempo, os mexicanos começam a se levantar em todo o território mexicano, sobretudo na região central.

Estabelecida a revolta pela liberdade religiosa, sentiram-se os fiéis no dever de estabelecer a Realeza de Cristo no México. Seu “grito de guerra” foi “VIVA CRISTO REI!” – e é por isso que foram inicialmente chamados de “Cristo Reieros” e, posteriormente, de “Cristeros”.

Macário e Miguel, os irmãos mais velhos de Jose Luis, se alistaram nas filas do Exército Libertador com autorização e bênção de seus pais, sob o comando do General Ignacio Sánchez Ramírez, líder da resistência local. Por sua pouca idade, apesar da sua insistência por ser um soldado de Cristo, “Joselito” não conseguiu permissão para entrar na guerra.

Em Guadalajara, teve a oportunidade de conhecer o testemunho do martírio do beato Anacleto Gonzalez Flores e, diante de seu túmulo, pediu a graça do martírio. Depois de inúmeras cartas ao general e de gigantesca insistência com os seus pais, afinal conseguiu autorização para marchar nas filas do exército cristero.

“Nunca foi tão fácil ganhar o Céu como agora; não posso perder essa oportunidade!”, disse o futuro mártir à sua mãe. Diante de tão ardente e heroico desejo de santidade, dona Maria del Rio não lhe pôde negar a bênção.

Em 1927, Jose se alinhou às hostes cristeras sob as ordens do General Prudêncio Mendonça, integrando o grupo liderado pelo General Rubén Guizar Morfin, em Cotija, Michoacán. Como Jose era muito novo, não lhe foi permitido pegar em armas, então ele servia aos soldados: cuidava dos cavalos, dos feridos, servia comida; todo o monótono trabalho ordinário de um acampamento militar lhe foi dado, o que santificou muito tão nobre espírito. Posteriormente, devido ao seu empenho, sua disciplina, sua edificante piedade e fidelidade à causa cristera, lhe foi permitido ser porta-estandarte e corneteiro do regimento.


Fotografia da Primeira Comunhão de Jose Sanchez del Rio, aos seus 9 anos de idade

Em 6 de fevereiro de 1928, se deu uma batalha onde o cavalo do General Guizar, morreu com um tiro. Joselito correu em seu socorro dizendo “meu general, aqui está meu cavalo, o senhor faz mas falta à causa que eu”; relutante, o general aceitou bater em retirada com o cavalo de nosso herói, que continuou disparando contra o inimigo até acabarem as munições. Pela caridade, o menino pagaria com seu sangue. Foi feito prisioneiro e levado a Cotija, onde se destacou por sua valentia e firmeza frente as ameaças e promessas de liberdade por parte dos federais, o que nos recorda os testemunhos dos mártires da igreja primitiva. Entre seus atos de coragem, disse: “Por que me oferecem liberdade? Sou seu inimigo! Fuzilem-me! Viva Cristo Rei!”. Com ele foi preso outro jovem, chamado Lorenzo, de origem indígena.

Logo que foi preso, escreveu à sua mãe dizendo: “Minha querida mãe, fui feito prisioneiro de combate neste dia. Creio que vou morrer. Mas não importa, mamãe, resigna-te à vontade de Deus. Não se entristeça por minha morte, antes diga a meus irmãos que sigam o exemplo de seu irmãozinho. E a senhora, faz a vontade de Deus, e manda-me tua bênção junto com a de meu pai. E tu, recebe o coração deste teu filho que tanto te quer”.

Em 7 de fevereiro, os dois jovens foram conduzidos a Sahuayo e postos à disposição do deputado federal Rafael Picazo, com a ordem de mata-los. Picazo era padrinho de Jose e muito próximo da família Sanchez, duas de suas irmãs eram religiosas. O deputado pediu pela liberdade de seu afilhado. A família do mártir estava disposta a pagar uma grande quantidade de dinheiro, mas Jose negou, porque já havia oferecido sua vida a Cristo.

Um dos atos que, digamos, foi a “gota d’água” para seus algozes foi porque o deputado Rafael havia importado galos finos de briga do Canadá e os colocado no templo profanado da paróquia de São Tiago Apostolo, onde prenderam Joselito. Diante de tal impiedade, indignado por tamanha falta de respeito à Casa de Deus, Jose matou todos os galos e os colocou no comungatório. Quando interrogado pelo deputado enfurecido, o menino mártir respondeu “aqui é uma igreja, lugar para orar, não para criar animais!”.

Na manhã de 8 de fevereiro, os dois jovens foram levados à praça principal, onde enforcam um jovem chamado Lázaro na presença de Jose. O corpo de Lázaro é entregue a um encarregado, que percebe que o jovem NÃO HAVIA MORRIDO, e o leva para sua casa. Alguns dias depois, Lázaro volta à frente de batalha. Jose continua preso no batistério paroquial, aqueles que o visitavam o viam tranqüilo, aceitando a morte, rezando o rosário e cantando louvores. Nestes dias, recebia secretamente a Sagrada Eucaristia escondida entre os alimentos... Era seu viático para a viagem definitiva.

Em 10 de fevereiro, quando foi dada a sentença de sua morte, escreve à sua tia, Maria Sanchez, sua última carta, conforme se segue:

Estou sentenciado à morte. Às oito e meia da noite chegará o momento que tanto tenho desejado. Te agradeço por todos os favores que me fizeste, tu e Madalena. Não me encontro capaz de escreve à minha mamãe: Faz-me o favor de lhe escrever. Diz à Madalena que consegui que me permitissem vê-la por última vez e creio que não se negará a vir [para que lhe levasse a Sagrada Comunhão], antes do martírio. Saúde a todos e tu receba, como sempre, a última vez o coração de teu sobrinho que muito te quer… Cristo Vive, Cristo Reina, Cristo Impera, e Santa Maria de Guadalupe!

Firmado: José Sánchez del Río, que morreu em defensa da Fé

Já avançada a noite, os algozes lhe tiraram, com facas, as plantas dos pés. A Graça do Espirito Santo, com sua Fortaleza, trabalhava neste mártir para a edificação dos fiéis e o assombro dos inimigos da Cruz.

Foi conduzido descalço pelas ruas de Sahuayo, até o cemitério municipal. Durante esta Via Crucis, o jovem vai rezando e gritando “QUE VIVA CRISTO REI! E VIVA A VIRGEM DE GUADALUPE!”. Tendo chegado ao cemitério, aos pés de sua tumba, e os soldados lhe apunhalaram diversas vezes e a cada golpe gritava com mais força e vigor “VIVA CRISTO REI! VIVA SANTA MARIA DE GUADALUPE!”.

Já agonizante, os soldados lhe perguntam com sarcasmo: “O que quer que digamos aos seus pais?” – “Que nos veremos no Céu! Viva Cristo Rei! Viva a Santa Maria de Guadalupe!”, responde o jovem santo. Um disparo terminou com sua vida e ali mesmo foi sepultado.

Independentemente do seu martírio, sua vida era a de um autêntico discípulo de Cristo. Seus restos mortais foram levados à paróquia de São Tiago Apóstolo, em Sahuayo, e hoje se constrói um santuário em sua honra, pois se prepara a festa de sua elevação aos Altares.
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Apoiamos o Programa Escola Sem Partido





Por Henrique Rodrigues Martins

ESTÁ EM TRAMITAÇÃO no Senado um projeto de lei que tem fundamental importância para a fé cristã, o qual dispõe sobre a inclusão, entre as diretrizes e bases da educação nacional, o "Programa Escola sem Partido" – nos vídeos acima, deputados comentam o assunto.

Falando de modo resumido, importa dizer que a aprovação deste projeto é de extrema importância para toda a família católica, principalmente porque propõe, no seu Art. 4º que "As escolas confessionais e também as particulares cujas práticas educativas sejam orientadas por concepções, princípios e valores morais, religiosos ou ideológicos, deverão obter dos pais ou responsáveis pelos estudantes, no ato da matrícula, autorização expressa para a veiculação de conteúdos identificados com os referidos princípios, valores e concepções" e no seu art. 5º § I "não se aproveitará da audiência cativa dos alunos, para promover os seus próprios interesses, opiniões, concepções ou preferências ideológicas, religiosas, morais, políticas e partidárias", bem como faz as escolas e universidades a divulgar que "é direito dos pais que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções", art. 5º § V.

ONGS, sindicatos e partidos políticos estão lutando contra o referido projeto e precisamos muito do apoio de toda a família católica neste momento. Caríssimo leitor, acesse o link abaixo para a consulta pública na página do Senado e, se possível, vote a favor do programa (para votar é necessário um rápido cadastro, mas os adversários da Igreja não têm preguiça e estão votando maciçamente). Vamos mostrar que existimos, somos maioria e exigimos que nossos governantes, cujos salários pagamos, cumpram a nossa vontade soberana:

https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=125666

Entrada de remédios, abertura de fronteira e prisioneiros políticos: prioridades dos Bispos na Venezuela


É DE CONHECIMENTO PÚBLICO que a Venezuela sofre com a tirania do seu governo comunista e, como sempre ocorreu na História mundial, quem sofre mais é o povo. A escassez das matérias básicas para a sobrevivência – alimento, papel higiênico, demais produtos de higiene e condições de vida dignas – oprime a população que sofre sob a sola da bota socialista.

Em resposta a isso, os Arcebispos e Bispos da Venezuela, reunidos na Assembleia Ordinária n.106, querem compartilhar com o povo venezuelano suas angústias, e desejam comunicar "a esperança de que, reconciliados e através do diálogo, encontraremos soluções eficazes para esta crise": assim tem início a Exortação final publicada na semana passada pela Conferência Episcopal Venezuelana (CEV), com a data de 12 de julho de 2016 e intitulada "El Señor ama al que busca la justicia" (Prov. 15, 9).

“A violência e a insegurança estão em todo lugar”, constatam os bispos, citando a agressão aos seminaristas, ocorridas no primeiro dia de julho (veja). O texto evidencia que “a identidade cultural venezuelana diminuiu e até mesmo se perde quando é avaliada somente se ligada ao projeto político prevalente. A democracia na Venezuela está trincada”.



Os bispos elencam 3 necessidades prioritárias:

1. "Existe a prioridade urgente: que o governo permita a entrada de medicamentos no país, visto a sua grave carência. Para a coleta e a distribuição, a Igreja oferece os seus serviços e as infraestruturas da Caritas, como outras formas de cooperação abertas a outros credos e instituições privadas. Este serviço não é a solução definitiva, mas é uma ajuda significativa";
2. "Existe a necessidade de abrir definitivamente o confim colombiano-venezuelano. Depois de permitir a sua abertura no domingo passado, 10 de julho, foi possível para muitos fiéis obterem alimentos, medicamentos e outros produtos. A passagem de milhares de cidadãos ao país vizinho é a prova da crise".

3. "Aumentam os cidadãos venezuelanos que estão nos cárceres, privados injustamente da liberdade, muitos deles por motivos políticos. A maioria vive em condições desumanas e sem um processo justo. Estas pessoas, sendo inocentes, devem ser colocadas em liberdade, ou pelo menos deveriam ser processadas, como estabelecido pelo código de Direito penal". (CE) (Agência Fides 13/07/2016)

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Fonte:
Fides, disp. em:
fides.org/pt/news/60432-AMERICA_VENEZUELA_Entrada_de_remedios_abertura_da_fronteira_e_prisioneiros_politicos_as_prioridades_dos_Bispos#.V4mk9_krIdU
Acesso 15/6/016

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Considerações amorosas (de um leigo) sobre o Sacerdócio Ordenado Católico

Fotografia rara, recentemente divulgada na web, de São João
Maria Batista Vianney, o Cura d'Ars, padroeiro dos padres

Por Felipe Marques – Assoc. São Próspero e Movimento Somar para Vencer

É O SACERDOTE QUEM continua a obra da redenção na Terra", afirmava São João Maria Vianney. Quão grande deve ser o nosso maravilhamento diante de tão profundo mistério! De fato, acrescentava o Santo Cura d'Ars: "(...) Se bem se compreendesse o que o sacerdote é na terra, morrer-se-ia, não de medo, mas de amor. (...) O sacerdócio é o amor do Coração de Jesus”[1].

O Sacerdócio ordenado católico é de um valor inestimável para nós, fiéis, pois “o Sacerdote, seja quem for”, como afirma São Josemaria Escrivá, “é sempre outro Cristo”[2].

Ora, não busco aqui escrever um texto apologético em defesa do sacerdócio católico contra as heresias e contra o paganismo; pretendo, antes, partilhar com o leitor o amor que tenho por tão grande e honroso ministério. Não busco também tecer críticas contra aqueles que são sacerdotes e não vivem de acordo com aquilo a que foram chamados, visto que prefiro dar ênfase aos bons exemplos de sacerdotes que conheci ao longo da vida, seja pessoalmente ou através de livros e outros meios de comunicação. Além disso, não cabe a mim o papel de julgar o clero. Pretendo que o leitor, se for leigo, ame a vocação sacerdotal, dê-lhe seu valor merecido e lute por santidade em seu estado de vida, com mais fervor; se for padre, que ame sua vocação e aceite a grandiosidade do que Deus lhe pede; que seja “fornalha do amor ardente de Deus.

Para ilustrar a magnanimidade dessa santa vocação de forma mais clara, cito as palavras do Frei São Leonardo de Porto-Maurício:

Admirai-vos, talvez, de me ouvir dizer que a Missa é uma obra maravilhosa? E não é, com efeito, inefável maravilha o que opera a palavra de um humilde sacerdote? Que língua angélica ou humana poderia explicar poder tão excessivo? Quem, jamais, pode imaginar que a palavra de um homem, que não tem, naturalmente, a força de levantar da terra uma palha, receberia da graça o poder surpreendente de fazer descer do Céu o Filho de DEUS?[3]

Oh, quão grande mistério é poder participar do Sacerdócio do próprio Cristo. Vejamos o que ensina o Catecismo da Igreja Católica sobre o sacerdócio ordenado católico:

1544. Todas as prefigurações do sacerdócio da Antiga Aliança encontram a sua realização em Jesus Cristo, «único mediador entre Deus e os homens» (1 Tm 2, 5). Melquisedec, «sacerdote do Deus Altíssimo» (Gn 14, 18), é considerado pela Tradição cristã como uma prefiguração do sacerdócio de Cristo, único «Sumo-Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec» (Heb 5, l0; 6, 20), «santo, inocente, sem mancha» (Heb 7, 26), que «com uma única oblação, tornou perfeitos para sempre os que foram santificados» (Heb 10, 14), isto é, pelo único sacrifício da sua cruz.

1545. O sacrifício redentor de Cristo é único, realizado uma vez por todas. E no entanto, é tornado presente no sacrifício eucarístico da Igreja. O mesmo se diga do sacerdócio único de Cristo, que é tornado presente pelo sacerdócio MINISTERIAL, sem diminuição da unicidade do sacerdócio de Cristo: «e por isso, só Cristo é verdadeiro sacerdote, sendo os outros seus ministros».

1546. Cristo, sumo sacerdote e único mediador, fez da Igreja «um REINO DE SACERDOTES para Deus seu Pai» (18). Toda a comunidade dos crentes, como tal, é uma comunidade sacerdotal. Os fiéis exercem o seu sacerdócio baptismal através da participação, cada qual segundo a sua vocação própria, na missão de Cristo, sacerdote, profeta e rei. É pelos sacramentos do Baptismo e da Confirmação que os fiéis são «consagrados para serem [...] um sacerdócio santo».

1547. O sacerdócio ministerial ou hierárquico dos BISPOS e dos PRESBÍTEROS e o sacerdócio comum de todos os fiéis – embora «um e outro, cada qual segundo o seu modo próprio, participem do único sacerdócio de Cristo» – são, no entanto, essencialmente DIFERENTES ainda que sendo «ordenados um para o outro». Em que sentido? Enquanto o sacerdócio comum dos fiéis se realiza no desenvolvimento da vida baptismal – vida de fé, esperança e caridade, vida segundo o Espírito – o sacerdócio ministerial está ao serviço do sacerdócio comum, ordena-se ao desenvolvimento da graça baptismal de todos os cristãos. É um dos meios pelos quais Cristo não cessa de construir e guiar a sua igreja. E é por isso que é transmitido por um sacramento próprio, que é o sacramento da ORDEM[4].

* * *


Por excelência, o sacerdote é o homem do sacrifício! O homem que oferta sua vida, oferta a si mesmo para oferecer sacrifícios a Deus em nome da assembleia, do povo de Deus. Ser ministro ordenado do próprio Cristo é algo incomparável! Para entender melhor o valor de tão grande chamado, tomemos por exemplo uma ferramenta: a ferramenta tem seu valor aumentado de acordo com a função que exerce e também de acordo com o operário que a manuseia; ora, o valor do padre é gigantesco visto que ele é uma ferramenta que Cristo utiliza para salvar almas. Em outras palavras: o próprio Cristo se faz presente no sacerdote.

Após o exposto acima, como não amar o sacerdócio? Graças a Deus tive a benção de conhecer ótimos padres durante minha caminhada na Igreja; louvo e glorifico a Deus pelas vidas de tantos bons padres que me acompanham em minha vida. Deus me deu um ótimo pai segundo a biologia e me deu ótimos pais espirituais, com isso posso ver fácil e claramente que nosso Pai do Céu é maravilhoso!

Depois de grande convivência com diversos sacerdotes, fui questionado por outrem sobre minha vocação, e também me questionei sobre isso. Após muito tempo de discernimento, mesmo não sendo santo como São Francisco de Assis, consigo entender o que ele afirmava com temor filial ao informar que sua vocação não era o sacerdócio: “Sou indigno de tão grande ministério”. Que grande poder é dado ao padre e, igualmente, que grande responsabilidade!

Deus dá a graça para que cada um consiga carregar a cruz que lhe cabe; sendo assim, como duvidar que é o próprio Senhor que chama as pessoas para viverem de acordo com seu santo Desejo? Como negar que é Ele quem assiste seus ministros para que se mantenham fiéis aos votos feitos livremente e fieis a missão que lhes fora confiada?

Como compreender que um homem abandona tudo para ganhar Aquele que É? Na sua pequenez, um rapaz doa sua vida inteira para viver para os outros! O padre nos ouve, orienta, perdoa nossos pecados conforme instituído pelo próprio Cristo, dá-nos O Senhor na Eucaristia... O padre é certeza da Presença de Cristo em nossas vidas! Explicar tamanho mistério? Creio que seja impossível. Mas podemos nos aproximar disso tudo, ilustrando esse quadro com as cores do amor que o próprio Deus tem por nós.

Ora, o que é a vocação senão o chamado dAquele que nos ama em primeiro lugar? Aceitar e viver a vocação é responder ao amor de Deus amando-O de volta através do próximo. É doar-se aos outros porque em primeiro lugar Deus se doou por nós; é ouvir o outro porque Deus nos ouve; é sacrificar-se porque Cristo sacrificou-se por nós! É amar verdadeiramente, é doar-se a si mesmo.

Sem o sacerdote não há Sacramentos; este é mais um motivo pelo qual devemos valorizar e rezar por todo o clero! Quão triste é ver, em alguns lugares, a ausência de “outros Cristos”, devido às perseguições e afins. É impossível me imaginar sem a Santa Missa e sem a Confissão; só de imaginar tais situações verto lágrimas, pois, quão grandes perigos minha alma correria sem tais socorros celestes!

Fico igualmente triste ao observar alguns padres que não vivem de acordo com a grandeza daquilo que são! Seja por má formação, ou por fraqueza, acabam se rendendo à partidos, ao dinheiro, a ideologias ou outras tentações às quais todos nós católicos estamos expostos e escolhem viver coisas menores do que aquilo mesmo que é o sacerdócio: ALGO GRANDIOSO. Agradeço a todos os padres, pelo sim de cada um e deixo um apelo a todos: sejam fieis à doutrina da Santa Igreja, sejam fieis à Sagrada Tradição e ao Sagrado Magistério, sejam obedientes e salvem almas. Garanto que pelo exemplo de santidade e coerência de vida, vocês arrastarão multidões para o Paraíso!

Padres, vocês são grandes, então tenham uma alma magnânima! Finalizo com um trecho da carta encíclica Sacerdotii Nostri Primordia de São João XXIII que cita um discurso de Pio XII: “O caráter sacramental da ordem chancela da parte de Deus num pacto eterno o seu amor de predileção, que exige em troca, da criatura escolhida, a santificação... O clérigo deve ser tido como um eleito entre o povo, cumulado dos dons sobrenaturais e participante do poder divino, numa palavra, um 'outro Cristo'... Já não pertence a si, nem aos parentes e amigos, nem mesmo à sua pátria. Deve consumi-lo um amor universal. Mais ainda, a caridade universal será o seu respiro, os seus pensamentos, a vontade, os sentimentos deixam de ser seus, para serem de Cristo, que é a sua vida”[5].

Dedico este texto aos bons sacerdotes que passaram por minha vida e me auxiliaram e ainda auxiliam no caminho de santificação, em especial ao meu pároco padre Francisco Reginaldo Henriques de Miranda, ao meu dileto diretor espiritual padre Adilson Oliveira, ao padre Paulo Ricardo, ao padre Paulo do Oratório de São Filipe Neri e tantos outros que não lembro agora, aceitem meus mais sinceros agradecimentos e minhas pobres orações.  

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Notas e referências:

1.
O amor do coração de Jesus, disponível em: https://padrepauloricardo.org/blog/o-amor-do-coracao-de-jesus


2.
São Josemaria Escrivá, Caminho ponto 66


3.
São Leonardo de Porto Maurício, As Excelências da Santa Missa, disponível em: http://alexandriacatolica.blogspot.com.br/2010/11/as-excelencias-da-santa-missa.html


4.
Catecismo da Igreja Católica, disponível em: http://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/p2s2cap3_1533-1666_po.html


5.
Carta Encíclica Sacerdotii Nostri Primordia do Papa São João XXIII, disponível em: http://w2.vatican.va/content/john-xxiii/pt/encyclicals/documents/hf_j-xxiii_enc_19590801_sacerdotii.html

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O Prefeito da Liturgia do Vaticano pede que todos os sacerdotes e bispos celebrem a Missa 'ad orientem' e fiéis comunguem de joelhos

NESTES TEMPOS DE CRISE, quando vemos uma multidão de católicos desorientados e tantas pobres ovelhas de um grande rebanho errando confusas entre muitos pastores, que as conduzem a pastagens tão diversas (por vezes às ervas venenosas ou mesmo aos abismos), surgem as palavras consoladoras de um grande e verdadeiro pastor, este sim, digno e zeloso. São como bálsamo para nossas almas. Louvado seja Nosso Senhor, que temos Dom Sarah!



Queridos padres, devemos ouvir novamente o lamento de Deus proclamado pelo profeta Jeremias: “Eles voltaram suas costas para Mim” (2,27). Voltemo-nos novamente para o Senhor!

LONDRES, 5 de JULHO de 2016 – Falando em uma conferência sobre a liturgia em Londres (em 4 de julho de 2016), o Cardeal Robert Sarah (foto), a mais alta autoridade sobre o assunto na Igreja Católica sob o Papa Francisco, pediu a todos os bispos e sacerdotes que voltem a adotar a antiga postura na Missa, onde o sacerdote se volta para o Tabernáculo, juntamente com toda a assembleia, em vez de permanecer de frente para o povo. Ele pediu que a postura seja adotada para o Advento deste ano, que começa aos 27 de novembro. Durante o mesmo discurso, Cardeal Sarah encorajou todos os católicos para que recebam a Comunhão de joelhos. Durante a sua conferência, o prefeito da liturgia do Vaticano revelou que o Papa Francisco lhe pediu para “continuar o trabalho litúrgico iniciado pelo Papa Bento (XVI).”

Observadores do Vaticano estão particularmente chocados de que o Papa Francisco, considerado por muitos como um liberal, tenha incentivado uma abordagem litúrgica tradicional. Todavia o cardeal Sarah disse: “Nosso Santo Padre Francisco tem o maior respeito pela visão litúrgica e pelas medidas do Papa Bento”.


Dom Dominique Rey

 O bispo francês Dominique Rey, presente na conferência, assumiu o pedido do Cardeal Sarah sem hesitação, prometendo, pelo menos, começar a implementar a mudança em sua diocese para o Advento. Rey, Bispo de Fréjus-Toulon, dirigiu-se ao Cardeal Sarah na conferência, dizendo: “Em resposta ao seu apelo, gostaria de anunciar, agora, que certamente, no último domingo do Advento deste ano, em minha celebração da Santa Eucaristia na Catedral, e em outras ocasiões, conforme apropriado deverei celebrar ‘ad orientem’ – voltado para o Senhor que vem”. Dom Rey acrescentou ainda: “Antes do Advento enviarei uma carta aos meus sacerdotes e fiéis sobre esta questão para explicar a minha ação. Devo incentivá-los a seguir o meu exemplo.”



E a tal 'inculturação' na Igreja?

Cardeal Sarah usou com propriedade do seu patrimônio africano para esclarecer com brilhantismo as coisas. “Eu sou um africano”; disse ele. “Deixe-me dizer claramente: a liturgia não é o lugar para promover a minha cultura. Pelo contrário, é o lugar onde minha cultura é batizada, onde minha cultura é levada para o divino!” [– Resistamos à tentação de imprimir grandes cartazes com a estas palavras e pendurá-las às portas das residências de certos bispos brasileiros...].

Sarah sugeriu que os Padres do Concílio Vaticano II pretenderam trazer mais fiéis para a Missa, no entanto, a maior parte deste esforço falhou. “Meus irmãos e irmãs, onde estão os fiéis dos quais os padres do Concílio falaram?”, perguntou; e prosseguiu:

Muitos dos fiéis são agora infiéis: eles não participam na liturgia. Para usar as palavras de S. João Paulo II: 'Muitos cristãos estão vivendo em um estado de apostasia silenciosa; eles 'vivem como se Deus não existisse'1. Onde está a unidade que o Concílio esperava alcançar? Nós ainda não chegamos a ela. Fizemos um progresso real em chamar toda a humanidade para o seu lugar na Igreja? Eu acho que não."

Ele expressou “profundo pesar” pelas “muitas distorções da liturgia em toda a Igreja de hoje”, e lembrou que a “Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambiguidades e reduções.”

Um dos abusos mencionados por ele é quando os padres “se afastam para permitir que os ministros extraordinários distribuam a sagrada Comunhão”, desde que muitos sacerdotes pensaram ser esta uma maneira de permitir uma maior e mais substancial participação dos leigos na Missa. Mas, conclui, “isto é errado, é uma negação do Ministério sacerdotal, bem como uma clericalização dos leigos” que não tem sentido e não é católica: “Quando isso acontece, é um sinal de que a formação foi muito errada, e que precisa ser corrigida”, acrescentou.

Ele incentivou uma recepção generosa da Missa tradicional em latim e também incentivou as práticas tradicionais propostas anteriormente pelo Papa Bento, incluindo o uso do latim na Missa nova, ajoelhando-se para a Santa Comunhão, bem como o canto gregoriano. “Devemos cantar música sacra litúrgica, e não apenas música religiosa, ou pior, canções profanas!”, enfatizou. “O Concílio nunca teve a intenção de que o rito romano fosse exclusivamente celebrado em língua vernácula, mas tinha a intenção de (apenas) permitir a sua maior utilização, em particular para as leituras”.

O prefeito da liturgia do Vaticano também fez questão de lembrar os sacerdotes de que eles estão proibidos de negar a Comunhão aos fiéis que se ajoelham para a recepção do Santíssimo Sacramento. Mais do que isso, encorajou todos os católicos a receberem a Comunhão ajoelhados, sempre que possível. “Ajoelhar-se na Consagração é essencial. No Ocidente, este é um ato de adoração corporal que nos humilha diante de nosso Senhor e Deus. É um ato próprio de oração. Onde essa reverência e genuflexão desapareceram da liturgia, é necessário que sejam restauradas, em particular no momento da nossa recepção a Nosso Santíssimo Senhor na Sagrada Comunhão”.

Uma longa seção de sua palestra foi dedicada a conclamar os sacerdotes e bispos a celebrar a Missa “ad orientem” ou, seja, com o padre e os fiéis, juntos, voltados para Nosso Senhor:

Mesmo que eu sirva como o Prefeito da Congregação para o Culto Divino, faço-o com toda a humildade, como um padre e um bispo, na esperança de que se promova uma reflexão madura, boa formação e boas práticas litúrgicas em toda a Igreja. (...) Quero fazer um apelo a todos os sacerdotes: eu acredito que é muito importante que nós retornemos o mais rapidamente possível para uma orientação comum, dos sacerdotes e dos fiéis voltados juntos na mesma direção – para o Leste, na direção do Senhor que vem – naquelas partes dos ritos litúrgicos quando estamos nos dirigindo a Deus. Este é um passo muito importante no sentido de garantir que, em nossas celebrações o Senhor esteja verdadeiramente no centro.

E então, queridos padres, peço-lhe para que implementem essa prática sempre que possível, com prudência e com a catequese necessária, certamente, mas também com a confiança pastoral de que isso é algo bom para a Igreja, algo bom para o nosso povo.

Durante todo o discurso, Cardeal Sarah destacou a grave responsabilidade dos sacerdotes em relação à Eucaristia. “Nós, sacerdotes; nós, bispos, temos uma grande responsabilidade”, disse ele. “Com o nosso bom exemplo construímos uma boa prática litúrgica; com o nosso descuido ou má conduta prejudicamos a Igreja e a sua Sagrada Liturgia!”; – e advertiu seus colegas sacerdotes: “Tenhamos cuidado com a tentação da preguiça litúrgica, porque é uma tentação satânica.”

_________
1. Exortação Apostólica Ecclesia in Europa, 28 de junho de 2003, 9.

Com Sensus Fidei. Publicado originalmente em: LifeSiteNews – Vatican Liturgy Chief asks all priests and bishops to face east for Mass, faithful to kneel for Communion
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Como Calvino me fez católico

'Calvino jovem' (Biblioteca de Genebra)

Testemunho de David Anders para o Called to Communion

Tradução de João Marcos – Associação São Próspero

UMA VEZ OUVI um pastor pregar um sermão sobre “História da Igreja”. Ele começou com Cristo e os Apóstolos, passou pelo livro dos Atos, saltou da Idade Média católica diretamente para a Reforma Protestante em 1517. De Lutero, ele foi até o avivalista britânico John Wesley, atravessou o Atlântico com os avivalistas americanos até chegar à sua própria igreja, em Birmingham, Alabama, no início dos anos 1990. Aplausos e louvores sucederam sua pregação. A congregação amou.

Eu também amei a pregação. Cresci numa igreja evangélica nos anos 1970, imerso no mito da Reforma. Eu tinha certeza que minha igreja pregava o Evangelho, que ela recebeu inalterado dos Reformadores. Depois da faculdade, obtive um doutorado em História da Igreja, o que me permitiu provar aos pobres católicos que eles estavam na Igreja errada.

Nunca pensei que o meu próprio fundador, o Reformador João Calvino, me levaria à Igreja Católica.

Eu fui criado presbiteriano, uma igreja que se orgulha das suas origens calvinistas, mas eu não me importava muito com denominações. Minha igreja praticava uma espiritualidade bíblica (sic) semelhante à da maioria das igrejas evangélicas. Na faculdade cristã e no seminário encontrei a mesma atitude. Batistas, presbiterianos, episcopais e carismáticos adoravam e estudavam lado à lado, todos apegados à Bíblia mas em desacordo quanto à forma de interpretá-la. No entanto, nossas diferenças não nos preocupavam. Diferenças sobre os Sacramentos, organização da Igreja e autoridade eram menos importantes para nós do que a relação pessoal com Cristo e a luta contra a Igreja Católica. É assim que compreendíamos a nossa dívida com a Reforma.

Após o seminário, comecei um Ph.D em História da Reforma. Meu foco era João Calvino (1509-1564), o reformador francês que transformou Genebra, na Suíça, no modelo de cidade protestante. Escolhi Calvino não apenas pelo meu passado presbiteriano, mas porque a maioria dos protestantes americanos têm alguma relação com ele. Os puritanos ingleses, os Pais Peregrinos, Jonathan Edwards e o “Grande Avivamento”[1]  – todos, fundamentados em Calvino, influenciaram profundamente a religiosidade americana. Meus professores descreviam Calvino como um grande teólogo; nosso teólogo. Eu pensava que se dominasse Calvino, eu conheceria realmente a fé.

Para minha decepção, dominar Calvino não me levou a nenhum lugar que eu esperava. Para começar, eu descobri que não gostava dele. Conheci um homem arrogante, julgador e inflexível. Mais importante, Calvino destruiu minha visão evangélica da História. Eu sempre assumi como verdade a perfeita continuidade entre a Igreja Primitiva, a Reforma e a minha igreja. No entanto, quanto mais eu estudava Calvino, mais estranho ele me parecia, muito diferente dos protestantes de hoje. Isto me levou a questionar toda a narrativa evangélica: Igreja Primitiva – Reforma – Cristianismo Evangélico. E se os "evangélicos" se desviaram de Calvino e da Reforma? O fio da história se rompeu. E se ele se rompeu uma vez, entre a Reforma e hoje, por que não teria se rompido antes, entre a Igreja Primitiva e a Reforma? Será que o fio da história evangélica chegou tão longe?

Calvino me chocou por rejeitar elementos-chave da minha tradição evangélica. A espiritualidade de nascido de novo, interpretação privada da Bíblia, uma abordagem acolhedora às outras denominações... – Calvino se opôs a tudo isso. Descobri que suas preocupações eram muito diferentes, muito mais institucionais, quase católicas. Apesar dele rejeitar a autoridade de Roma, existiam elementos da fé católica que ele nunca pensou em abandonar. Ele assumia como certo que a Igreja deveria ter uma única autoridade interpretativa, uma liturgia sacramental e uma fé unificada.

Estas descobertas me deixaram com importantes questões à mente. Por que Calvino deu tanta importância a essas “coisas católicas”? Ele estava certo em dar tanta importância a elas? Em caso positivo, ele estaria certo em abandonar a Igreja Católica? O que essas descobertas me ensinavam sobre o Protestantismo? Como minha igreja podia chamar Calvino de "fundador" estando tão longe dos seus ensinamentos? Será que toda a teologia protestante estava destinada à confusão?


Entendendo a Reforma Calvipenista

Calvino foi um reformador da 2ª geração, 26 anos mais novo que Martinho Lutero (1483-1546). Isso significa que já na sua época a Reforma se havia dividido em facções. Na sua terra natal, a França, não havia apoio do rei ao Protestantismo e nem liderança unificada. Advogados, humanistas, intelectuais, artistas e artesãos liam os escritos de Lutero, junto com a Bíblia, e adaptavam o que lhes agradava [na confusão que é um típico fruto da tese do livre exame, e que permanece até hoje].

Essa variedade marcou Calvino como o caminho certo para o desastre. Ele era advogado e sempre odiou qualquer forma de desordem social. Em 1549, escreveu um pequeno tratado (Advertissement contre l’astrologie) no qual aborda essa diversidade protestante:

Cada estado [de vida] tem seu próprio evangelho, que eles fabricam para si mesmos de acordo com seus apetites, de forma que há tanta diferença entre o evangelho da corte, o evangelho dos juízes e advogados e o evangelho dos mercadores, como há entre as moedas de diferentes regiões."

Comecei a ter dificuldades com as diferenças entre Calvino e seus descendentes quando descobri seu horror à diversidade teológica. Calvino foi formado na teologia de Lutero, mas ele se incomodava com a “multidão grosseira” e a “plebe vulgar” que transformou a doutrina de Lutero numa desculpa para desordem. Ele escreveu o seu primeiro grande trabalho, "As Institutas da Religião Cristã" (1536), em parte para tratar desse problema.

Calvino teve a chance de botar seus planos em prática quando se mudou para Genebra, Suíça. Ele começou a participar da Reforma em Genebra em 1537, quando fazia pouco tempo que a cidade havia abraçado o Protestantismo. Calvino, que já havia começado a escrever sobre teologia, estava insatisfeito com as medidas tomadas pela cidade. Genebra aboliu a Missa, expulsou o clero católico e professou lealdade à Bíblia, mas Calvino queria mais. Seu primeiro pedido ao Conselho da Cidade foi que ele impusesse uma confissão comum de fé (escrita por ele mesmo), forçando todos os cidadãos a professá-la.

A mais importante contribuição de Calvino a Genebra foi a criação do Consistório – um tipo de corte eclesiástica – para julgar a pureza moral e teológica dos cidadãos. Ele também persuadiu o conselho a implementar um conjunto de “Decretos Eclesiásticos” que definiam a autoridade da igreja, estabelecia as obrigações religiosas dos leigos e impunha uma liturgia oficial. O comparecimento à igreja era obrigatório. Contrariar os ministros era crime de blasfêmia. As Institutas de Calvino foram declaradas a doutrina oficial.

O maior objetivo de Calvino era obter o poder de excomungar fiéis “indignos”. O conselho da cidade lhe deu esse poder em 1555, quando a imigração francesa e escândalos locais deixaram o eleitorado a seu favor. Calvino utilizou-se desse poder frequentemente. De acordo com o historiador William Monter, de cada 15 cidadãos um foi intimado a comparecer perante o Consistório entre 1559-1569, e 1 em cada 25 foi excomungado[2]. Calvino utilizou esse poder para implementar sua visão de Cristianismo único e punir dissidentes.


Um Calvinista descobre João Calvino

Eu estudei Calvino durante anos antes que o significado real do meu aprendizado viesse à tona. Então, finalmente, percebi que Calvino, com sua paixão pela ordem e autoridade, estava do lado oposto ao espírito individualista da minha tradição evangélica. Nada deixou isso mais claro para mim do que sua luta contra o ex-monge carmelita Jerome Bolsec.


Jérôme Hermès Bolsec

Em 1551, Bolsec, convertido ao Protestantismo, entrou em Genebra e ouviu uma aula sobre teologia. O tópico era a doutrina calvinista da predestinação, que dizia que Deus predeterminava o destino eterno de cada alma. Bolsec, que acreditava firmemente no Sola Scriptura (Só a Escritura) e no Sola Fide (Só a Fé), não gostou do que ouviu. Ele pensou que essa doutrina fazia de Deus um tirano. Quando desafiou a doutrina de Calvino, foi aprisionado.

O que torna o caso Bolsec interessante é que ele rapidamente evoluiu para uma disputa sobre a autoridade da igreja e a interpretação da Bíblia. Bolsec, da mesma forma que muitos "evangélicos" de hoje, argumentou que ele era cristão, que ele tinha o Espírito Santo e, consequentemente, tinha tanto direito quanto Calvino de interpretar a Bíblia. Ele prometeu se retratar caso Calvino provasse sua doutrina apenas pela Bíblia. Mas Calvino não fez isso. Ele ridicularizou Bolsec chamando-o de agitador (Bolsec desfrutava de grande simpatia do público), rejeitou seu apelo à Bíblia e determinou que o conselho agisse com dureza. Ele escreveu a uma amiga que desejava ver Bolsec “apodrecer numa vala”[3].

O que a maioria dos "evangélicos" de hoje não sabem é que Calvino nunca defendeu a interpretação privada (ou laica) da Bíblia. Enquanto rejeitava a autoridade de Roma, ele arrogou essa autoridade a si mesmo(!). Ensinou que os “pastores reformados” eram sucessores dos profetas e apóstolos, com autoridade para interpretar a Bíblia. Insistiu que os leigos deveriam suspender o julgamento em matérias difíceis e “manter-se unidos com a igreja”4.

Calvino levou muito a sério a obrigação de submissão e obediência dos leigos. Contrariar os ministros era uma das razões mais comuns de ser intimado ao Consistório e as penas podiam ser severas. Há uma imagem em particular na minha mente: abril de 1546. Pierre Ameaux, cidadão de Genebra, foi forçado a rastejar até a porta da residência do bispo, com sua cabeça descoberta e uma tocha em sua mão. Ele suplicou o perdão de Deus, dos ministros e do conselho da cidade. Seu crime? Ele se opôs ao ensino de Calvino. O conselho, graças aos apelos de Calvino, decretou a humilhação pública de Ameaux.

Ameaux não foi o único. Nas décadas de 1540 e 1550, o Conselho condenou vários que se opunham aos ministros ou à sua teologia. Além disso, quando Calvino obteve o direito de excomungar, ele não hesitou em utilizá-lo contra essa “blasfêmia”. Os “evangélicos” atuais, desacostumados com a excomunhão, podem subestimar a severidade desta pena, mas Calvino a compreendia em seus termos mais severos. Ele ensinou várias vezes que os excomungados estavam “distantes da Igreja e, consequentemente, de Cristo”[5].

Se as ideias calvinistas sobre a autoridade da igreja foram uma surpresa, seus pensamentos sobre os sacramentos foram um choque. Diferente dos “evangélicos” de hoje, que tratam a teologia dos sacramentos como algo secundário, Calvino ensinou que eles eram da maior importância. De fato, ele ensinou que um correto entendimento da Eucaristia era necessário para a salvação. Esta era a tese do seu primeiro tratado teológico em francês ('Petit traicté de la Sainte Cène', 1541). Frustrado pela discórdia protestante sobre a Eucaristia, Calvino escreveu o texto numa tentativa de unificar o movimento em torno de uma única doutrina.

Evangélicos costumam confiar na sua “relação pessoal com Cristo”, e não na filiação a alguma igreja ou na participação em algum ritual. Calvino, no entanto, ensina que a Eucaristia dá “garantia indiscutível da vida eterna”[6]. E apesar dele não chegar ao entendimento católico, ou mesmo luterano, da Eucaristia, ele ainda reteve a doutrina da Presença Real. Ele ensinou que a Eucaristia concede uma “verdadeira e substancial participação no Corpo e Sangue do Senhor” e rejeitou a noção de que os comungantes recebem “apenas o Espírito, omitindo a Carne e o Sangue”[7].

Calvino entendia o Batismo da mesma forma. Ele nunca ensinou a doutrina evangélica de que alguém “nasce de novo” apenas através da conversão pessoal. Pelo contrário, ele associou a regeneração com o Batismo e ensinou que negá-lo era negar a salvação. Ele também não permitiu diversidade no modo de receber o Batismo. Os anabatistas de Genebra (que batizavam adultos) foram presos e forçados a pedir perdão. Calvino ensinou que os anabatistas, ao negar o sacramento às suas crianças, colocam-se fora da fé.

Uma vez, Calvino persuadiu um anabatista chamado Herman a entrar na Igreja Reformada. Sua descrição do evento não deixa dúvida sobre a diferença entre Calvino e o “evangélico” moderno. Calvino escreve:

Herman retornou, se não estou enganado, de boa fé à amizade da Igreja. Ele confessou que fora da Igreja não há salvação, e que a verdadeira Igreja está conosco. Consequentemente, ele era um desertor enquanto permaneceu numa seita separada da Igreja. [8]

Os “evangélicos” atuais não entendem mais essa linguagem. Eles se acostumaram a tratar “a Igreja” apenas como uma realidade espiritual, somente representada através das denominações ou em qualquer lugar onde se reúnam os “verdadeiros crentes”. Esta não é a visão de Calvino. A sua visão é a da “verdadeira Igreja” marcada pelo Batismo infantil, fora da qual não há salvação.


Entendendo o Evangelicalismo

Estudar Calvino me fez levantar questões importantes sobre a minha identidade evangélica. Como eu poderia tratar como “assuntos sem importância” questões que meu próprio fundador considerou essenciais? Eu considerei “sem importância” o Batismo e a Eucaristia, e a própria Igreja como algo “meramente simbólico”, “puramente espiritual” ou, em último caso, desnecessário. No seminário também encontrei um ambiente onde os professores discordavam em todo assunto e ninguém se importava! Sem nenhuma instância superior para apelar, nós permanecemos numa teologia do “mínimo denominador comum”.

A História da Igreja, porém, me ensinou que essa atitude é recente. João Calvino tinha grandes expectativas pela unidade e catolicidade da fé, e pela centralidade da Igreja e dos sacramentos. Mas mesmo o Calvinismo não conseguiu fazer isso. Fora de Genebra, sem a força do Estado para impor uma versão, o próprio calvinismo se dividiu em facções. No seu livro "Orthodoxies in Massachussetts: Rereading American Puritanism", a historiadora Janice Knight detalha como este processo começou logo no início do calvinismo americano[9].

Não surpreende saber que, no século 18, líderes calvinistas dos dois lados do Atlântico desistiram da busca pela unidade. A nova abordagem era enfatizar a experiência subjetiva do “novo nascimento” (em si mesma uma doutrina nova, de origem puritana) como única preocupação necessária. O famoso avivalista George Whitefield tipificou essa visão, chegando ao ponto de insistir que Cristo não queria a concordância em outros assuntos. Ele disse: "Era melhor pregar o novo nascimento, e o poder da religiosidade, e não insistir muito na forma: porque as pessoas nunca pensarão o mesmo sobre isso; nem Jesus Cristo pretendeu isso"[10].

Desde o século 18, o Calvinismo foi reduzindo-se mais e mais a um pequeno conjunto de questões sobre a natureza da salvação. Tanto é assim que, para a maioria das pessoas, a palavra Calvinismo significa apenas a doutrina da predestinação. O próprio Calvino tornou-se apenas um símbolo, um mito que os "evangélicos" utilizam apenas para apoiar suas alegações de continuidade histórica.

A grande ironia da minha pesquisa foi constatar que o Evangelicalismo, longe de ser o herdeiro direto de Calvino, na verdade representa a falência do Calvinismo. Enquanto Calvino dedicou sua vida à busca pela unidade doutrinal, o evangelicalismo moderno está enraizado na negação dessa busca. O historiador Alister McGrath nota que o termo “evangélico”, que existiu na Cristandade por séculos, assumiu seu sentido moderno apenas no século 20, com a fundação da Associação Nacional dos Evangélicos (1942). Esta sociedade foi criada para permitir a ação pública coordenada entre grupos que concordavam apenas com o “novo nascimento”, mas discordavam em todo o resto [11].


Um calvinista descobre o Catolicismo

Eu cresci acreditando que o evangelicalismo era “fé que uma vez foi dada aos santos”[12]. Aprendi pelo estudo da história protestante que essa fé dificilmente era mais antiga que Whitefield, e certamente não era a mesma fé dos Reformadores. O que fazer? Retornar ao século 16 e viver como um autêntico calvinista? Eu já sabia que o próprio Calvino, com toda a sua insistência em unidade e autoridade, não teve êxito. Seus próprios seguidores acabaram em anarquia e individualismo.

Então percebi que Calvino era parte do problema. Ele insistiu na importância da unidade e autoridade, mas rejeitou qualquer base racional para essa autoridade. Ele sabia que a Bíblia totalmente sozinha, interpretada por cada consciência individual, era uma receita do desastre. Mas a sua própria autoridade (de Calvino) era totalmente arbitrária. Sempre que era desafiado, ele apelava à sua própria consciência ou à sua experiência subjetiva, mas ele negava esse direito a Bolsec e outros. Como resultado, Calvino se tornou orgulhoso e severo, brutal com seus inimigos, intolerante. Em todo o meu estudo sobre Calvino, eu não me lembro de ele pedir desculpas ou admitir erros uma única vez.

Eventualmente, constatei que a atitude de Calvino contrastava com a atitude dos maiores teólogos católicos. Vários deles eram santos, reconhecidos por sua caridade heroica e humildade. Além do mais, eu sabia pelos seus escritos, especialmente de Sto. Tomás de Aquino, Sta. Catarina de Siena, Sta. Teresa de Ávila e S. Francisco de Sales, que eles negavam qualquer autoridade pessoal para definir doutrina. Eles se curvaram voluntariamente, até alegremente, à autoridade do Papa e dos concílios. Eles podiam manter o ideal bíblico de unidade doutrinária (1Cor 1,10) sem afirmarem ser a fonte dessa unidade.

Estes santos também desafiaram o estereótipo de católicos que eu tinha. "Evangélicos" frequentemente assumem que são eles os únicos que têm uma “relação pessoal com Cristo”. Católicos, com seus rituais e instituições, são supostamente alienados de Cristo e da Bíblia. Apesar disso, encontrei (nos santos) homens e mulheres totalmente focados em Cristo e inebriados com sua Graça.

O teólogo católico que teve o maior impacto em mim foi, sem dúvida, Sto. Agostinho (354-430). Em toda a minha vida, ouvi que a Igreja primitiva era protestante e evangélica. Meus professores do seminário e até mesmo Calvino e Lutero sempre apontavam para Sto. Agostinho como seu grande herói da Igreja Primitiva. Quando eu finalmente pesquisei Agostinho, no entanto, descobri o Catolicismo completo. Agostinho amava a Bíblia e falou profundamente sobre a Graça de Deus, mas ele os compreendia no sentido católico. Ele destruiu o que restava da minha visão evangélica da história.

No fim, eu vi que cada coisa boa do Evangelicalismo já estava presente na Igreja Católica – a devoção calorosa à espiritualidade evangélica, o amor pela Bíblia e até mesmo, em certo ponto, a tolerância evangélica à diversidade. O Catolicismo sempre tolerou escolas de pensamento, várias teologias e liturgias diferentes. Mas, ao contrário do Evangelicalismo, a Igreja Católica possuía uma maneira lógica e consistente de distinguir entre o essencial e o não-essencial. O Magistério da Igreja, estabelecido por Cristo (Mt 16,18; 28,18-20), era a fonte daquela unidade que Calvino queria substituir.

Uma das coisas mais agradáveis da minha descoberta da Igreja Católica é que ela satisfaz plenamente meu desejo por raízes históricas. Eu comecei a estudar História acreditando na continuidade da fé e tentando desesperadamente encontrá-la. Até mesmo quando eu pensei encontrá-la na Reforma, eu ainda devia lidar com o enorme período da Idade Média, católica. Agora, graças ao que Calvino me ensinou, não existem mais pontas soltas. Em 16 de novembro de 2003, finalmente abracei a “fé que uma vez foi dada aos santos”. Eu entrei na Igreja Católica.

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Notas:

1. N.T.: os 'Avivamentos' ou 'Despertamentos' eram períodos de grande expansão evangélica nos EUA e Reino Unido. Um pouco da sua história pode ser encontrada em:
http://www.mackenzie.br/7080.html

2. 'The Consistory of Geneva, 1559-1569', Bibliothèque d’Humanisme et Renaissance 38 (1976): 467-484

3. Carta à Madame de Cany, 1552

4. 'Institutes of the Christian Religion', ed. J. T. McNeill, trans. Ford Lewis Battles. Philadelphia: Westminster Press, 1960: 3.2.3, 4.3.4

5. Institutas 4.12.9

6. 
Institutas 4.17.32

7. 
Institutas 4.17.17; 4.17.19

8. 'Letters of John Calvin', trans. M. Gilchrist, ed. J.Bonnet, New York: Burt Franklin, 1972, I: 110-111

9. Cambridge: Harvard University Press, 1994

10. Citado em Mark A. Noll, 'The Rise of Evangelicalism: The Age of Edwards, Whitefield and the Wesleys'. Downers Grove: IVP, 2003, 14

11. 'Evangelicalism and the Future of Christianity'. Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1995, 17-23.

12. N.T.: Judas 1,3

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Fonte:

Called to Communion, 'How John Calvin Made me a Catholic', disp. em
http://www.calledtocommunion.com/2010/06/how-john-calvin-made-me-a-catholic/
Acesso 27/6/016
www.ofielcatolico.com.br
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