Evágrio Pôntico: uma brevíssima apresentação

O artigo abaixo é uma resenha do prof. Igor Andrade  (Fraternidade Laical São Prósperodo curso do Prof. Dr. Joel Gracioso (ibidem) sobre Evágrio Pôntico e as "Oito Doenças Espirituais". 



EVÁGRIO PÔNTICO ou Evágrio do Ponto foi um monge nascido por volta do ano 345, natural da Capadócia, Ibora, no Ponto. Passou dezesseis anos de sua vida no deserto do Egito, como anacoreta[1]. Foi discípulo e amigo de São Gregório Nazianzeno, o que lhe pôs em contato com a tradição filosófica. Evágrio conheceu bem cedo os Três Capadócios: São Basílio, São Gregório de Nissa e São Gregório de Nazianzo, sendo ordenado diácono por este último. Morreu por volta de 397, deixando inúmeras obras sobre a oração e a vida monástica e ascética.

    Evágrio Pôntico é um dos grandes autores da Tradição Cristã cuja importância e contribuição se foram perdendo de vista. Para conhecer sua influência e importância, é preciso conhecer o contexto no qual se encontra o mesmo autor; em seguida analisar os conteúdos propriamente ditos, a começar pela antropologia evagriana.


São Gregório Nazianzo, São Basílio e São Gregório de Nissa

    O modo que Evágrio Pôntico tem de ver o ser humano deriva do seu modo de ver o mundo e a Criação. Esta última é pensada pelo autor como feita em duas etapas: a criação primeira – onde Deus teria feito os entes racionais – que não deve ser entendida como anterior cronologicamente, mas ontologicamente, isto é: os entes constituídos na existência mais perfeitamente (em um grau hierarquicamente superior) são os primeiros; a segunda é quando os intelectos puros usaram mal seu livre arbítrio e decaíram – aí entra o problema da alma racional, que é uma alma (portanto, ligada a um corpo) cuja racionalidade não está ligada a um intelecto puro, mas a um decaído (que não está na condição primeira, de pureza).

    Fundamentado na tradição grega da “tripartição da alma”, Evágrio diz que Deus dispôs, na alma racional, três partes – uma parte sublime (racional) e duas partes inferiores (irascível e concupiscível).

    Assim, no dia a dia, o ser humano tem uma alma ligada a um corpo, mas é chamado a buscar aquela unidade originária, o que implica buscar uma saúde não só do corpo, mas da alma.

    Daí parte para a vida prática, que não consiste, necessariamente, em uma vida ativa exterior que se contrapõe à vida contemplativa, mas por “prática” ele entende um método espiritual que purifica a parte apaixonada da alma, porque esta parte (se não for purificada) desestabiliza a unidade da alma e a tira do rumo certo.

    As paixões são o caminho para a tentação, e quando não somos tentados pela presença de alguma coisa, somos tentados pela sua lembrança – que não é somente resultado de uma capacidade natural, mas também é investida demoníaca. Ressaltamos, porém, que Evágrio não propõe em momento algum a supressão das dimensões irascível e concupiscível, porque essas dimensões, quando bem ordenadas (isto é, submetidas à razão), são frutuosas.

    Sem sombra de dúvidas, àqueles que se propuserem a aprender com os ensinamentos de tão grandioso Padre da Igreja, muitos frutos espirituais aguardam colhimento nesta vida – e, com certeza, na outra.

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1. Os anacoretas eram monges ou eremitas que assumiram com radicalidade a pobreza evangélica, vivendo retirados e/ou enclausurados, dedicando-se à oração contínua e à produção de obras catequéticas e litúrgicas. Buscavam incessantemente o estado de graça e a pureza da alma por meio da Contemplação.


3 comentários:

  1. Tenho uma dúvida sincera ao monge Evagrio, uma irmã religiosa, disse-me que ele foi considerado herege pela igreja. Estou a procurar sobre isso e não encontro nada nesse sentido, poderia esclarecer essa confusão?

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  2. Ótima pergunta. Também tenho esta dúvida...

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    1. O assunto é amplo, meus caros, mas basicamente Evágrio Pôntico foi um seguidor de Orígenes e de suas doutrinas, assumindo um importante papel na difusão do origenismo entre os monges egípcios do deserto. De fato ele foi o líder de uma linha monástica origenista e foi, sim, condenado (mais de uma vez) por heresia. Mas é preciso saber que os tempos eram outros, e, apesar disso, contribuiu positivamente para a Igreja, traçando as principais doenças espirituais que afligiam os monges, justamente os oito males do corpo, algo que foi utilizado por João Cassiano no Oriente e, depois, pelo Papa Gregório Magno, que a adaptou para o Ocidente na forma dos sete pecados capitais (reduzindo de 8 para 7) que conhecemos hoje.

      Fraternidade Laical São Próspero

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