Para entender esse pensamento, de onde surgiu e como tomou conta de tantas mentes no interior da própria Igreja, é necessário fazer uma breve retrospectiva. Rudolf Bultmann, influente teólogo protestante nascido na Alemanha na primeira metade do século XX, foi bastante influente no período pós-segunda guerra mundial. O próprio Bultmann, por sua vez, foi fortemente influenciado pela filosofia existencialista do também alemão Martin Heidegger. O pressuposto da filosofia existencialista é o empirismo, segundo o qual só é real o que se pode comprovar por meio da experiência sensível, localizando-se no terreno da metafísica ou da simples mitologia tudo o que não se enquadre nesta regra.
Assim, diz Bultmann que, assim como os primeiros cristãos interpretaram o “Jesus histórico” a partir da sua hermenêutica, essa mesma atitude deveria ser tomada hoje, ou seja, para ele, Jesus deve ser interpretado a partir de uma visão existencialista. Após a morte de Bultmann, a visão existencialista de Jesus que ele propôs deu lugar à hermêutica marxista, principalmente nos países da América Latina e pontualmente em alguns países da Europa. Também na linha marxista os milagres de Jesus não podem ser tomados como verdadeiros. Pior, esperando por milagres, estaria o povo de Deus deixando de lutar pela revolução que construiria o Reino do Céu aqui na Terra, perdendo tempo com o espiritual e o transcendente.
Para nós, católicos, Jesus, o Cristo, não é uma ficção, uma invenção que se parece com massa de modelar, da qual cada um faz o que bem quiser, segundo a sua interpretação particular. Para nós, Jesus é Deus que se fez homem. Este é também, claramente, o centro do Evangelho. Deus Todo-Poderoso se fez homem de maneira extraordinária. Veio no ventre de uma Virgem, sem interferência humana, salvar-nos de nossa miséria, Milagre dos milagres.
Não acreditar em milagres é a característica de alguém que certamente não é cristão. E nós respeitamos e sabemos conviver bem com as pessoas que não têm a mesma fé que nós temos, mas não admitimos a desonestidade de quem diz que é cristão, por um lado, e por outro renegar a existência dos milagres de Deus. Quem age assim não é apenas culpado de uma pequena heresia, mas sim de apostasia, o que é muito mais grave, conforme esclarece bem o O Código de Direito Canônico que rege a Tradição da Igreja, da seguinte maneira:
Chama-se heresia a negação pertinaz (proposital e persistente), após a recepção do Batismo, de qualquer verdade que se deva crer com fé divina e católica, ou a dúvida pertinaz a respeito dela; chama-se apostasia o repúdio total da fé cristã; chama-se cisma a recusa de sujeito ao Sumo Pontífice ou de comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos.
(CDC, cân. 751)
Bultman, então, não pode ser considerado cristão, na medida em que não crê no milagre da Encarnação de Jesus; é, portanto, um apóstata da fé. Cremos que Deus veio em Jesus Cristo, de maneira extraordinária e misteriosa. Assim, não é possível dizer que Deus não intervém na história com milagres. Outro bom exemplo é o do padre espanhol Torres Queiruga, que afirma que Deus, ao criar o mundo, criou também as suas leis e, por isso, seria incoerência da parte de Deus ter criado estas leis para depois quebrá-las(!). Assim, conclui ele, não haveria milagres, pois Deus não poderia quebrar as leis que Ele mesmo criou. Ora, se é assim e Deus não pudesse fazer algo que estivesse fora das suas leis, não poderia também ter-se encarnado e ressuscitado e, assim, seria vã a nossa fé (1Cor 15,2).
Não é de se estranhar, portanto, que em seu livro “Repensar a ressurreição”, o Padre Torres Queiruga afirme que não perderia a fé caso encontrasse o cadáver de Jesus. Para ele, a ressurreição é uma quimera, uma fantasia, um símbolo, mas não uma realidade ocorrida neste mundo.
Os milagres de Jesus realmente ocorreram e são sinais que apontam para verdade de Deus, a qual transcende àqueles momentos históricos e atinge todas as gerações de todos os séculos, seja qual for a mentalidade da época. Trata-se de uma mensagem sempre válida que deve ser acolhida com fé.
Sobre esse assunto há um livro muito interessante de Mons. Louis Claude Fillion, célebre exegeta francês que traduziu e comentou a Vulgata e foi consultor da Pontifícia Comissão Bíblica. O livro se chama "Los milagros de Jesucristo, El enigma explicado desde la perspectiva racional y la mirada religiosa" e nele o autor se propõe a demonstrar a autenticidade dos milagres de Nosso Senhor contra os erros dos racionalistas. Para aqueles que leem em espanhol é uma obra altamente recomendável, a melhor que já li sobre o tema. Há alguns trechos disponíveis no Google Books: https://books.google.com.br/books?id=6ocN5EFklNwC&printsec=frontcover&hl=pt-BR&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false
ResponderExcluirAtt.,
Felipe Melo
A paz de Jesus Cristo.
ResponderExcluirObrigado por mais um texto importante, necessário nos dias de hoje onde a Fé, me parece, virou mercadoria negociável para quem se diz cristão.
Como pode alguém, logo um padre, afirmar que" Outro bom exemplo é o do padre espanhol Torres Queiruga, que afirma que Deus, ao criar o mundo, criou também as suas leis e, por isso, seria incoerência da parte de Deus ter criado estas leis para depois quebrá-las(!)". Então, Deus não poderia mudar algo que ele achasse que deveria mudar, por exemplo?
Partindo desse princípio, que os milagres são simbólicos, todo o ato do Criador no Antigo Testamento ( Dilúvio, destruição de Sodoma e Gomorra, etc.), também são "simbólicos"? Que absurdo! Um padre e um protestante partilhando as mesmas heresias, que bonito!
Infelizmente, eu vivi isso em um curso de Teologia para leigos oficial da Diocese onde eu vivo. Um padre que disse isso e muito mais absurdos que prefiro não comentar aqui. Por isso eu desisti, não terminei o curso.
Quem defende esse Cristo totalmente humano, sem ligação Divina com o Pai, além de negar a Santíssima Trindade, defende a ideia que Jesus Cristo foi um simples profeta, nada mais. "cristãos" assim deveriam fazer como o atual papa; dar as mãos aos muçulmanos que também alegam ter sido Jesus Cristo apenas um profeta. Oremos e devemos agir também.
Salve Maria!