O segredo cristão e católico para a felicidade – já neste mundo

"Filhos, sede alegres! Não quero escrúpulos nem tristeza: Basta-me que não façais pecados."
(São Filipe Neri, 'o Santo da Alegria')[1]

HOJE É DIA DE DIREÇÃO espiritual! O prof. Henrique Sebastião vai compartilhar com os seus leitores o seu maior segredo para a felicidade que já é possível neste mundo! Meu nome é Paula, sou graduanda de sociologia em uma universidade de Curitiba e entrei em contato com esse homem admirável há umas semanas para pedir uma entrevista para um trabalho da faculdade. Ele disse que podia responder algumas perguntas e essa conversa aconteceu pelo Whatsapp. Do que ele me falou eu fiz questão de transcrever a resposta da minha pergunta: “O que é a felicidade? Dá para ser feliz neste mundo ou nós temos que esperar para sermos felizes só no Céu?”.

    Mandei essa transcrição para ele, dizendo que a resposta dele mudou a minha vida (de verdade!), e ele perguntou se podia fazer uma revisão no meu texto e postar nesse maravilhoso site O Fiel Católico. Depois eu acrescentei mais algumas coisinhas que eu tinha “pulado” na nossa conversa gravada e ficou esse texto que para a minha honra vai ser postado. Prefiro não divulgar o meu nome completo por motivos particulares, mas o que me deixa muito feliz (olha aí a felicidade já nesse mundo!) é saber que com certeza vai ajudar muitas outras pessoas, como me ajudou.

[Nota: Eu acrescentei ainda mais alguns trechos à transcrição da Paula, que julguei necessários para complementar as ideias apresentadas. (Henrique Sebastião)]


O que é a felicidade? Dá para ser feliz neste mundo ou temos que esperar até chegar no Céu?


Introdução à resposta

Sinto-me satisfeito com a oportunidade de responder a essa pergunta, porque eu me dediquei a encontrar essa grande resposta por um longo tempo, uma boa parte da minha já longa vida. De fato, ainda hoje me ocupo dessa questão em minhas meditações, porque, afinal, é um dos maiores problemas da vida humana, senão o seu problema central.

    No fim, tudo converge para isto: Por que nos preocuparmos com questões assim transcendentais? Por que buscar Deus? Por que cumprir a sua vontade? Por que modificamos e moldamos toda a nossa vida baseados naquilo que a Religião (por pressuposto, obviamente, a Religião verdadeira) nos ensina? Por que abrir mão de tantos prazeres e negar aos nossos corpos tantas satisfações que nos pede, em prol de algo que não vemos? Por que dedicar nossas vidas inteiras à busca contraintuitiva de uma realidade que, no fim e ao cabo, não temos como comprovar (por isso a Fé é necessária enquanto estivermos neste mundo)?

    Lembro-me de quando eu era criança e já gostava muito de ler. Nunca fui aquele típico menino da minha geração; todos os meus amigos da escola gostavam de jogar bola, empinar pipa, correr e fazer algazarra pela rua o tempo todo. Eu trocava tudo isso pelo prazer de ficar horas e horas sentado num canto, lendo e relendo meus poucos livros, que ganhava de algumas tias. Com 9 ou 10 anos eu já tinha lido vários clássicos da literatura, dentre os quais me lembro com carinho de “O homem da máscara de ferro”, “Os três mosqueteiros”, “O Conde de Monte Cristo”, “Robin Hood” e “A tulipa negra” (eu ganhara uma coleção antiga do Alexandre Dumas, de quem virei fã depois de ler a primeira página...).

    Além do gosto pela leitura, eu tinha um desejo maior, porém, e já "antigo", que fora despertado logo na segunda infância: o desejo por Deus. Essa verdadeira ânsia irrompeu de dentro de mim, com força total, realmente muito cedo, quando eu descobri (aos 4 anos de idade, numa conversa altamente 'filosófica' que tive com minha mãe) que a vida de toda pessoa neste mundo, um dia, teria fim, inclusive a vida da minha mãe – e a minha própria. E, como agora eu sabia que um dia ia morrer, eu tinha que encontrar uma solução, um jeito de escapar desse destino, encontrar uma porta de saída que me levasse a viver para sempre. Assim começou a busca de uma vida inteira, mas não demorou nada para eu entender que a única solução possível estava no Papai do Céu. Se eu queria evitar a morte e viver eternamente, era Ele o único que poderia me ajudar. Afinal, Ele criou tudo e nos deu a vida.

    Assim, juntando uma coisa com outra, rapidamente eu me entreguei à leitura dos livros religiosos aos quais conseguia ter acesso. Claro que, na minha época, uma criança pobre como eu não tinha acesso a muita coisa, e eu só vim a conhecer alguma obra teológica muito tempo depois. Mas comecei pelas vidas dos Santos, ali com os meus 10 anos e... foi uma experiência aterrorizante!

    Não vou entrar em detalhes para que essa resposta não se torne longa demais, mas o fato é que todas as biografias de Santos que eu lia eram sempre verdadeiros festivais de sofrimento, de dor, de provações, de penitências atrozes e sem fim... Eu procurava desesperadamente por alguma história com final feliz e alguma mensagem positiva, algo que me incentivasse a ser santo, mas tudo que me chegava eram histórias de pessoas boas sofrendo injustiças, sendo humilhadas, padecendo de doenças terríveis ou sendo torturadas e mortas! A biografia de Santa Rita, com sua chaga malcheirosa e cheia de vermes, que ela chamava "meus anjinhos", é um pouco demais para uma criança, certo?

    Desnecessário dizer que alguém falhou na tarefa de filtrar aquilo que deveria ser lido por um gurizinho totalmente imaturo, mas, afinal, eram só antigos livrinhos de piedade que ninguém lia, aparentemente, então ninguém sabia o que continham. E as coisas eram assim, antigamente. A Igreja ministrava aos fiéis (e isso foi uma longuíssima fase), com poucas exceções, uma “pastoralidade” extremamente negativa, angustiosa, com uma invariável e generalizante ênfase na dor, no sofrimento, na necessidade da mortificação, da penitência, da negação dos sentidos... Não poucos Santos não só aceitavam a dor, mas rezavam a Deus pedindo por mais e mais sofrimento, para se configurarem a Cristo.

    É a chamada Teologia do dolorismo, que se constitui da valorização extrema da dor, elevando-a não só à condição de fundamento das práticas cristãs como a colocando no centro de toda a espiritualidade. Ora os Santos do passado se flagelavam de maneiras espantosas, faziam penitências realmente terríveis e infindáveis, sofriam cruzes e provações pavorosas (e pediam por isso!), ao que indicam os seus biógrafos. Isso era possível para eles por terem sido muito agraciados, por sua generosidade sobrenatural e sua natureza muito elevada. Mas também não se pode honestamente deixar de dizer que, muito possivelmente, ao menos em parte, esses grandes feitos e essas histórias tenham sido (ás vezes muito) exageradas ou supervalorizadas. 

    Bem, seja como for, o fato é que isso gerou em mim uma aversão pela ideia de ser católico. Eu não queria sofrer, eu queria ser feliz! O que, por sua vez, gerava um sentimento de culpa, uma autocrítica constante e desmedida, um sentimento de autopunição intermitente, porque no fundo eu me achava um covarde, um fraco miserável e maldito, um verme inútil incapaz de fazer o que eu devia fazer: aceitar essa via dolorosa, e com alegria, como aqueles Santos todos, afinal Jesus sofrera ainda mais, e quem eu pensava que era, para ousar querer ser feliz?

    Nessa busca angustiosa e me sentindo sem forças para ser um “mártir branco” (isto é, sofrer um martírio interior e lento todos os dias, sem esperanças de felicidade até o fim da minha existência neste mundo, o que pode ser pior do que se submeter a um golpe de espada por se recusar a adorar um falso deus), ainda muito jovem eu me tornei um sofredor crônico: desenvolvi uma patologia decorrente da consciência escrupulosa que me fez, em certo sentido, o mais penitente dos homens, pelos  meus intensos sofrimentos mentais, desordenados e fora de propósito.

    Infelizmente, nesse longo, longo tempo, eu não conheci um São Francisco de Sales, com a sua direção espiritual amorosa e acolhedora, nem uma Santa Teresinha, com a sua maravilhosa “Pequena Via”, ou um São Filipe Neri, com sua visão positiva e sempre otimista em relação à existência. Demorou e custou realmente muito para eu entender que a felicidade – e a sua própria busca – é uma condição primordial da vida humana, absolutamente natural e necessária para a manutenção da saúde mental e espiritual para todos; que não se pode viver bem sem a aspiração de ser feliz, a não ser por alguma condição patológica, e, mais ainda, que não é possível nem razoável pedir a quem quer que seja que sacrifique toda a expectativa de ser feliz no agora em troca de uma felicidade que virá somente após a morte. Isso é simplesmente inviável, e os grandes ascetas só conseguiam viver como viviam, no fundo, porque pela Graça divina haviam dominado a arte de obter felicidade na própria dor, e obter satisfação na própria privação. Além disso, a realidade do Céu era, para eles, algo totalmente presente e até palpável, não uma mera expectativa de um futuro distante.

    Ainda é preciso observar, antes de concluir esta introdução, que toda a Teologia católica, seja nos Padres da Igreja, nos seus grandes Santos por suas obras e exemplos, nos Doutores, nos Papas e no sagrado Magistério, ocupou-se pouco do tema da felicidade, ao tratar da bem-aventurança ou da beatitude, até porque, em última análise a desvinculou sempre de qualquer experiência ordinária ou possível neste mundo, relacionando-a à contemplação do Sumo Bem, que é Deus, o que só será possível em plenitude na próxima vida.


Resposta


Depois de expor a grande dificuldade da vida de santidade e o quanto pode ser ainda mais difícil entender e aceitar que assim é pela vontade de Deus: que as coisas têm que ser realmente difíceis, que precisamos expiar as nossas culpas e nos purificar dos nossos defeitos, sofrer e nos privar de muita coisa todos os dias, que a dor inevitavelmente faz parte do processo... posso dizer agora, afinal — e foi somente na maturidade, há relativamente pouco tempo —, que eu descobri as chaves que solucionam tudo e abrem as portas para uma vida interior livre e... feliz. E isso mesmo vou compartilhar, agora, com você.

    – A primeira chave para ser feliz está na INTERIORIDADE. Não vou ter como explicar isso muito bem em breves palavras, sugiro para tanto a leitura atenta, reflexiva e exaustiva de Santo Agostinho. Tentarei resumir da maneira mais simples possível (porque essa resposta não pode ser complicada nem complexa, mas tem que ser muito simples e fácil de entender), dizendo que a Verdade plena (com as respostas que tanto buscamos) não pode ser encontrada fora, e sim dentro de nós: Deus é a Verdade íntima no homem, o fundamento primeiro e último do próprio ser.

    Por isso, temos a necessidade de meditar, contemplar, de fazer oração mental além da vocal, olhando para dentro de nós mesmos para alcançar uma intimidade com Deus que nos permita compreender, n’Ele, a nós mesmos, e assim superar os nossos temores, fraquezas e confusões. 

    Há muitos métodos para se fazer isso, como a Lectio Divina, mas para mim funciona melhor o método descrito na obra mística clássica “A nuvem do não saber”. Basicamente, é a pessoa colocar-se a sós e em silêncio e entregar-se completamente a Deus, apenas deixando-se como que se “desvanecer”, serenamente, pouco a pouco — com todas as suas angústias, limitações, fraquezas, temores, suposições, interpretações e pressupostos particulares —, nesse Deus que é Espírito Perfeitíssimo, que é a Justiça pela qual ansiamos, e que é, sim, Amor (o discípulo que o definiu assim foi justamente o mais amado por Ele).

    A consequência inevitável dessa vivência da interioridade é o desarmamento e a entrega total a Deus: reconheço-me com todas as minhas imperfeições, confessando as minhas infidelidades e fraquezas, assumindo a minha pequenez diante d’Ele, e termino naturalmente concluindo (não da boca para fora, mas verdadeira e profundamente) que tudo o que eu fizer — a partir disso que agora sou —, tudo o que eu for capaz de conquistar, todas as coisas que eu vier a desfrutar ou padecer, são para Ele, em satisfação dos meus pecados e para tudo o mais que a sua santa Vontade determinar.

    Se eu sou pequeno e falho, usarei então do que tenho, do que sou capaz a partir dessa pequenez e dessa fraqueza, para Deus. E se eu fracassar, ao menos me consolará o mínimo bem que eu puder fazer. E me consolará saber que, ainda que no fim eu seja condenado ao Inferno, isso será um triunfo da Justiça, para a maior glória de Deus! O Bem vencerá infalivelmente, assim eu confio em Deus e deixo de sofrer inutilmente aquele sofrimento doentio, muitas vezes por antecipação, por arrogantemente querer que as coisas sejam como eu considero que têm que ser. Foi essa percepção, exatamente, que libertou São Francisco de Sales, que baseou também nela a sua direção espiritual.

    Esse viver a interioridade, assim, creio que tenha ficado claro: não significa mergulhar num  solipsismo infrutífero, e sim procurar viver a vida de fé como deve ser vivida, “em espírito e em verdade”.


    – A segunda chave para ser feliz está na JUSTA MEDIDA para todas as coisas. Aparentemente, mais uma vez veio Santo Agostinho em meu socorro, mas não só ele. Aqui estamos diante de uma verdade tão inescapável que me surpreende ver como a humanidade nunca consegue aplicá-la para resolver os seus grandes problemas: se observarmos as eras históricas, vemos como a sociedade sempre viveu, em todos os tempos, migrando de um extremo ao outro, indo e voltando, de novo e de novo, alternando períodos em que tenta compensar um extremo correndo diretamente para o extremo oposto, o que nunca dá certo, mas não se aprende nunca essa lição básica.

    Aqui estamos diante de algo que eu já comprovei na prática muitas e muitas vezes, assim como também cada um de nós, em nossas experiências de vida pessoais. Mais do que isso, muitos dos maiores sábios de todos os tempos, tanto aqueles movidos pela luz da razão natural como os que foram agraciados pela Revelação divina, ensinaram isso mesmo.

    • Ora o mais sábio dos homens, Salomão, inspirado pelo Espírito Santo escreveu no Livro dos Provérbios: “Examina os caminhos em que pões os teus pés, e que sejam sempre retos; não te desvies nem para a direita e nem para a esquerda, mas afasta o mal dos teus pés” (Pr 4,27). A Palavra divina aconselha os crentes que sigam a trilha reta, localizada num ponto médio entre os extremos, sem se desviar para a direita ou para a esquerda, desvio este que é uma tentação sofrida por todos nós, e aí está a raiz de muitos males.

    • Mais de quinhentos anos antes de Cristo, o príncipe Sidarta Gautama, que foi sem dúvida um homem sábio e foi chamado “Iluminado” (Buda), sem ter acesso à Revelação, depois de muito sofrer e penitenciar-se em busca da verdade, privando-se de qualquer prazer e se entregando aos jejuns e às técnicas ascéticas mais extremas, compreendeu e ensinou o “Caminho do Meio” como a grande solução para todo aquele que quisesse superar as dificuldades e distrações do mundo e encontrar a virtude. “Se as cordas de uma cítara estão muito tensas, rompem-se; se estiverem frouxas, não serão capazes de produzir música”.

    • Aristóteles, nascido em 384 a.C., que nunca conheceu o Buda e também não teve acesso à Revelação, entendeu igualmente que “a virtude está no meio”, enquanto que os extremos se configuram em vícios: é a sua assim chamada "Doutrina" ou "Ėtica do Meio Termo".

    • Santo Tomás de Aquino, o maior dos teólogos, não deixou de ensinar o mesmo princípio, ao tratar da necessidade de se buscar um alívio para a fadiga da alma em algum prazer, afrouxando o esforço do labor mental. Nas suas “Conferências dos Padres”, conta como João Evangelista (tinha que ser o Discípulo Amado), quando alguém se escandalizou de o ver jogando com os discípulos, mandou ao questionador que, de arco na mão, disparasse uma seta, e, depois, repetiu a mesma ordem, e depois novamente, várias e várias vezes. Depois de essa pessoa repetir isso muitas vezes e estar já estafada, perguntou-lhe João se poderia continuar a fazê-lo, sem parar, ao que o outro respondeu que, se assim procedesse, o arco se quebraria. Então, o Santo observou que, da mesma forma, a alma se romperia se permanecesse sempre tensa. Curiosamente, aqui se pode aplicar o mesmíssimo princípio da alegoria da cítara, usada por Gautama: se a corda for muito tensionada, o arco se partirá; se for deixada frouxa, não poderá disparar a seta. Um, iluminado sobrenaturalmente pela Revelação, outro, naturalmente, pela razão que Deus concede aos homens (e certamente aguça naqueles de boa vontade), chegaram à mesma conclusão.

    Poderíamos usar de muitíssimos outros exemplos, mas já é o bastante e mais que suficiente para provar que homem algum poderá ser feliz ou manter uma vida plena e realizada em Deus enquanto continuar alternando a sua posição entre os extremos da vida, diante de cada problema que se lhe apresenta.

    Para concluir esta reflexão, quero tomar o exemplo dos nossos pastores atuais que, nestes dias de grande confusão na Igreja, estão inertes diante de tantas e tão graves profanações e de toda a apostasia que grassa a partir da mais alta hierarquia: segundo não poucos pensadores importantes, este é o resultado, justamente, daquilo que eu expus no início: uma reação (herética) à doutrina dolorista que foi por tanto tempo imposta (muitas vezes abusivamente, gerando pesados traumas) e se reflete agora nessa aversão à mortificação e a tudo o que lembre sacrifício, penitência, abstinência, etc. Palavras como “castigo” e “Inferno” estão proibidas, e sequer se admite que pessoas de fé recebam a comunhão de joelhos, num gesto de humilde adoração!

    Antes, houve um exagero, num extremo radical, com um desvio nocivo "para a direita", se podemos dizer assim, parafraseando Salomão: visava-se o bem e a santidade, mas sem dúvida parece ter havido um excesso desnecessário e prejudicial, resultando numa melancolia espiritualmente contraprodutiva, uma compreensão das coisas sempre excessivamente escrupulosa e limitante. Todavia, em reação, partiu-se desse grande surto rigorista que fazia sofrer as almas para um afrouxamento absurdo, uma falsa liberdade que a tudo aceita, tudo acolhe, tudo permite e que vai resultar, enfim, em um mal ainda pior.

    Antes, criminalizava-se todo prazer em nome da santidade e da espera do porvir, isto é, da felicidade a se concretizar somente no Céu. Visando-se a eternidade, esticava-se a corda excessivamente, fazendo partir o arco. Agora, criminaliza-se toda prática de busca honesta pela santidade em nome do bem-estar  no aqui-agora. Estamos tão preocupados em não quebrar o arco que deixamos a corda totalmente frouxa e, assim, o próprio arco se torna inútil, não serve para nada e não vai poder cumprir a sua finalidade, que é disparar a seta em direção ao seu alvo.

    O arco, claro, somos nós. A seta é a Fé que resulta na vida de piedade, o alvo é a vida eterna. A esse arco deve ser aplicada a devida tensão. Se formos frouxos ou laxos, sabemos bem qual será o resultado catastrófico para a nossa vida interior, porque nos tornaremos espiritualmente inúteis e incapazes. Se alimentarmos uma consciência escrupulosa, colocamo-nos também em risco, porque a corda arrebenta ou o arco se parte pelo excesso de tensão, tornando-nos igualmente incapacitados. O segredo está na justa medida dada a todas as coisas, como ensinou Santo Agostinho e todos os outros — fé e razão, oração e descanso, penitência e lazer, trabalho e um pouco de diversão, e tudo com leveza, com a alegria que deve ser a marca distintiva dos cristãos, como ensinou o gigante São Filipe Néri.

    O cristão que não foi agraciado com virtudes extraordinárias ou heroicas deve, sim, saber aceitar as dores que lhe são dadas, e igualmente deve saber alegrar-se com as boas coisas desta vida que vier a receber. Rezar e penitenciar-se (com jejuns, abstinências, orações e esmolas, por exemplo) e também alegrar-se e descansar regularmente, dando graças a Deus em tudo.

    Sim, é fato que a felicidade plena, a beatitude perfeita, só alcançaremos no Céu. Mas o bom cristão experimenta um prenúncio das alegrias do Céu já aqui na Terra, na sua vida quotidiana, pelo amor a Deus e serviço ao próximo. Isso não é nenhum pecado, mas é sinal de uma vida, como queria Platão, bela e justa. E santa.

______
[1] "Vida de São Filipe Neri, Apóstolo de Roma", pelo Revmo. Padre Bacci, disp. em:
https://www.liturgialatina.org/oratorian/bacci2.htm
Acesso 17/11/2023.

4 comentários:

  1. Que texto maravilhoso! no começo pensei que estava estranho, mas amei a conclusão .

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    1. Aprendi muito com esse post. parabéns por abrir a sua vida pra ensinar o próximo!

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  2. Obrigado por seu trabalho, dedicação e por compartilhar conosco sua fórmula de felicidade de acordo com a Santa Igreja.

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    1. Muito obrigado pelas palavras de incentivo, meu caro. Se decidi falar sobre isso é porque o demônio não me dá um só dia de descanso, desde o dia em que decidi fazer apostolado, e por vezes a vida se torna demasiado dura, o peso vai ficando pesado demais se não nos vigiamos para não cair na tentação dos escrúpulos excessivos. É preciso aprender a descansar, vez em quando, sob a sombra da Cruz do Salvador. Deus o abençoe e guarde.

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