2024: Ateus famosos e influenciadores mudam sua postura com relação à Religião e à Igreja

DANIEL DENNETT, AUTOR ateu, faleceu em 19 de abril deste 2024. Há alguns anos, ele foi uma das figuras mais controversas do debate público nos Estados Unidos e no Reino Unido: em 2006, Dennett lançou o livro que na tradução para o português recebeu o título “Quebrando O Encanto. A Religião Como Fenômeno Natural”. Ao lado de Richard Dawkins, Sam Harris e Christopher Hitchens, ele ficaria conhecido como um dos “quatro cavaleiros do ateísmo”... Esse grupo ganhou espaço nos meios de comunicação nesse período em que todos estavam traumatizados com o 11 de setembro, e as atenções se voltavam para os efeitos potencialmente nocivos do fanatismo religioso. O argumento do quarteto ateu era radical: para o bem comum, o mundo devia se livrar das religiões (todas elas) e seus dos efeitos, o quanto antes.


    Dizem que o tempo é o senhor da razão. Bem, os tempos mudaram, esses homens tão inteligentes e também tão ingênuos mudaram também: parecem ter amadurecido e que, com a maturidade, finalmente conseguiram enxergar algo que para nós sempre foi muito óbvio. Alguns dias antes da morte de Dennett, o membro mais conhecido do grupo havia dado uma declaração que indicava uma mudança de postura. Em uma entrevista à rádio britânica LBC no começo de abril, o zoólogo Richard Dawkins afirmou tranquilamente — para o desespero da militância ateísta adolescente que infesta a internet — que ele agora se sente "culturalmente cristão": “Acredito que, culturalmente, somos um país cristão, e eu me considero culturalmente cristão. Eu amo hinos e as canções de Natal. Sinto-me em casa no etos cristão”, ele disse.


    É uma mudança bastante significativa na postura de Dawkins, que, no passado, igualava todas as religiões ao nível de "um delírio", no próprio título de seu livro mais vendido.


    Mas Dawkins não foi o único a seguir esse caminho. Porque o islamismo e certas ideologias radicais cresceram no vácuo que o Cristianismo deixava ao ser abandonado por multidões, e isso finalmente começa a ser notado. Cada uma a seu modo, outras figuras públicas parecem ter passado a prestar mais atenção às consequências do esvaziamento da Religião tradicional no Ocidente. Conforme a influência do Cristianismo deixa de ser dominante, abria-se espaço ao radicalismo progressista e/ou ao islamismo, que tendem a ser muito menos tolerantes para com as liberdades individuais que são tão caras aos ateus.


    No ano passado, a aclamada escritora Ayaan Hirsi Ali anunciou que havia se convertido ao Cristianismo. Assim como Dawkins, ela chegou à conclusão de que não, as religiões NÃO são todas iguais. Criada em família muçulmana, ela havia se tornado ateia décadas antes. "Todo o tipo de liberdade aparentemente secular — de mercado, de consciência e de imprensa — tem suas raízes no Cristianismo", escreveu ela, ao explicar a jornada que a levou à Fé cristã.


    Voltando a Dawkins, este arranjou uma briga com movimentos de esquerda ao dizer, como biólogo geneticista que ele é, que as diferenças entre os sexos são, sim, objetivas e imutáveis. Além disso, sua afirmação sobre o “Cristianismo cultural” foi uma reação à divulgação de versos islâmicos no painel da estação de trem King's Cross, em Londres, durante o Ramadã. O geneticista concluiu que, das alternativas disponíveis, o Cristianismo parece ser a que mais respeita o bom senso e os direitos individuais. E em graus diversos, outros ateus fizeram uma trajetória similar. A lista inclui o escritor britânico Tom Holland, que se tornou católico, o autor canadense Jordan Peterson, cuja esposa converteu-se recentemente (saiba mais) e que vem flertando com o Cristianismo, e o apresentador de TV americano Bill Maher, que continua ateu mas passou a criticar os excessos de grupos progressistas.


    Esse fenômeno é tão real e notável que já virou tema de livro: o autor britânico Justin Brierley passou os últimos anos entrevistando ex-ateus que passaram a crer em Deus. Formado em Filosofia na Universidade de Oxford, ele lançou recentemente um livro e uma série de podcasts sobre o tema.


    Brierley conversou com o excelente portal Gazeta do Povo, que é a fonte deste artigo. Segundo ele, a trajetória de Dawkins é semelhante à de outros ex-descrentes. “Estou vendo isso com cada vez mais frequência entre ateus, mesmo alguns que eram muito anticristãos (como Dawkins) no passado. Acho que eles estão cada vez mais percebendo que os valores em que acreditam são produto de sua herança judaico-cristã", afirmou.


    Na opinião de Brierley, as consequências do esvaziamento religioso em países como a Inglaterra se tornaram mais evidentes nos últimos anos, o que fez muitos ateus repensarem as consequências de uma visão radical contra a religião. “Conforme outros sistemas de valores começam a ameaçar essa herança, (por exemplo, a ideologia woke ou regimes autoritários de esquerda), eles começaram a perceber que o Cristianismo tem sido bom para nossa cultura”, diz Brierley.


    Ele também notou um aumento no número conversões realmente religiosas (e não apenas culturais) de ateus ao Cristianismo, citando que o motivo mais frequente disso é o contato com cristãos que os ajudaram a desfazer preconceitos sobre a Igreja.


    "Eles têm contato com cristãos atenciosos e gentis que ajudam a superar seus preconceitos sobre o Cristianismo e a Igreja. Isso rompe a barreira e permite que eles comecem a levar o Cristianismo a sério", diz Brierley. Na sequência, conclui, os motivos mais comuns para a conversão do ateísmo ao Cristianismo são uma experiência emocional que os levou à fé em Deus, ou argumentos intelectuais como os indícios que apontam para o design inteligente do Universo.


    Este último, por exemplo, foi o que levou o célebre filósofo Antony Flew do ateísmo à crença em Deus. Autor do influente "A Presunção do Ateísmo", de 1976, ele atribuiu ao avanço da cosmologia e da biologia a sua guinada existencial. A notícia veio a público em 2004. Três anos depois, Flew publicou um livro que, em português, ganhou o título de "Deus Existe — As provas incontestáveis de um Filósofo que não acreditava em nada".




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